Como já dissemos uma vez, Mestre é quem tem aluno - isso tanto para os verdadeiros mestres quanto para os falsários. Mas apesar do caminho ser tão claro, as pessoas parecem não querer enxergá-lo. Mesmo os mestres se afligem de encontrar discípulos tão ingratos e desleais, e se perguntam: no que falhamos? Ou será que o próprio caminho falha?
Mesmo um sábio como Confúcio teve seu Ranqiu, ou Jesus teve seu Judas. Os grandes mestres não se eximem de abrigar os traidores, mesmo sabendo que eles podem abandonar o caminho. Mas as pessoas não nascem para trair ou atraiçoar. Não é por isso, pois, que o caminho deve ser abandonado, bem como quem o trilha não se preocupa com o que vêm do mau, mas com o que pode advir de bom. Assim sendo, as recompensas não são imediatas, e queira o Céu que possamos ser dignos de ver frutificar algumas de nossas ações no tempo de nossa vida.
No entanto, o que investigamos aqui, do modo bem breve, é o seguinte: existem bons e maus discípulos? Se o sábio expande sua mente em direção a humanidade, ele não deveria pensar nestes termos. Mas como disse Confúcio, às vezes também não se pode talhar madeira podre, ou rebocar paredes com esterco - do mesmo modo, não se pode perder muito tempo com discípulos que não querem nada para si mesmos. O próprio Confúcio completou: "antigamente, ouvia o que as pessoas me diziam: hoje, vejo o que elas fazem". Ao que se referia o Mestre, portanto?
Que os bons discípulos fazem o que tem que ser feito. Se erram, o fazem por imaturidade, mas não por deslealdade. Um bom discípulo simplesmente luta para melhorar a si mesmo, e assim sendo, angaria a atenção do mestre. Coloca o cumprimento de seus deveres acima das coisas particulares, pois sabe que seu aprendizado diz respeito a coisas superiores. No dia em que seu mestre o dispensa, ele lamenta, pois sabe que agora deve aprender sozinho. Quanto ao mestre, se entristece por afastar-se de um amigo, mas se regojiza por ver que seu discípulo está apto a superá-lo, e somente se preocupa que ele siga o caminho correto, e continue promovendo o que aprendeu.
Mas e o mau discípulo? Este ganha a oportunidade de aprender, mas se lamenta; sempre coloca barreiras particulares ao seu aprendizado, e espera a condescendência do mestre; diante de qualquer esforço maior, reclama; e após concluir o mínimo, pede favores e distinções.
Discípulos como estes reclamam em surdina de seus mestres; lamentam seu esforço árduo, e não reconhecem o que aprenderam. Sua vida é uma condenação, até que conhecem um mestre farsante.
Daí, o que faz o mau discípulo? Agarra a oportunidade como nunca. Pega tudo o que aprendeu com o bom mestre, e o que o tornou um bom discípulo, e entrega de mãos beijadas ao mestre farsante. Torna-se discípulo deste. O mestre farsante promete que ele receberá o título de mestre de modo fácil, contanto que lhe seja fiel - e claro, fiel aos seus próprios interesses, o mau discípulo aceita. Não aprende muita coisa nova, mas sua deslealdade não o permite perceber isso: afinal, sua meta de obter o reconhecimento como mestre está próxima.
O mau discípulo ainda maldiz sua sorte anterior, reclamando de seu mestre, sem reconhecer que o que aprendeu - e o que não aprendeu - dependiam mais de si mesmo do que do seu guia antecessor. Deste modo, ele não tem receio algum de afirmar que o que tem de bom deve ao seu novo mestre. Equivoca-se em muitas coisas, mas seu mestre enganador abençoa seus erros, propondo-lhe que ele é uma vítima das circunstâncias da vida. Em breve, o mau discípulo esquece mesmo quem esteve do seu lado, nos momentos difíceis, e confunde o bem com o proveito. Quando obtém seu título, satisfaz-se com si mesmo, e parte para a vida tentando reproduzir seus enganos.
Obviamente, as dificuldades em enganar as pessoas são muitas. Mesmo os mais comuns demoram algum tempo até perceber, porém, que se tratam de farsantes, mas percebem. Trambiqueiros precisam de muito dinheiro e bons contatos para se manterem ativos. A partir desta época, pois, a vida de um mau discípulo - e agora, mau mestre - torna-se uma eterna fome, uma insatisfação total dos sentidos, e uma incompreensão perene sobre o que é a vida.
O que se fazer com maus discípulos? Nada, pois. Em toda a vida, os que são movidos por bons propósitos irão dedicar seu tempo aos outros. Isso implica que, às vezes, um bom mestre pode esperar algum tempo até ver se um discípulo se emenda ou não. Ele faz o que pode, mas não é possível alterar o íntimo de uma pessoa, se ela mesmo não o desejar. Assim, o bom mestre dá liberdade aos discípulos, para que escolham o que querem; disciplina, para que aprendam e se preparem corretamente; e amor, pois um mestre deseja a amizade de seus pequenos. Na ausência de uma dessas três coisas, um mestre não pode dar disciplina para quem não ama nem sabe o que quer; não pode ensinar a querer para quem não tem disciplina ou amor; e não pode ensinar a amar para quem não tem disciplina ou desejo por algo.
Por esta razão, amar ao mundo e praticar o Ren é uma fadiga gratificante, mas cansativa. Tudo por causa dos maus discípulos e dos maus mestres, que decidem por insistir em sua própria ignorância, e se comprazer em suas fraquezas.
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