O que o céu nos deu foi nossa natureza; O que a natureza nos deu é nossa humanidade. Só sabemos que somos humanos por meio do estudo. Logo, está em nossa natureza estudar, e só por meio dela nos tornamos humanos. Assim sendo, devemos sempre estudar, porque é de nossa natureza e o único meio de buscar compreender o mundo e a nós mesmos; e é nosso dever, tanto quanto o é de nossa natureza, investigar as causas, os meios e as razões pelas quais devemos ter ciência do curso correto da vida.
São cinco as fases da vida, tal como são as fases da natureza; a fase de criança (em que yang é ascendente, que é madeira), a de jovem (em que yang é pleno, que é fogo), a de adulto (em que surge o equilíbrio; yang começa a declinar, e surge yin, que é terra); homem maduro (em que yin é descendente, que é metal); e ancião (em que yin é pleno, que é água).
Por esta razão, as crianças estão em desordem, e precisam ser educadas, tal como o ancião precisa se pôr e manter em ordem, em função da degenerescência natural. As crianças devem ser contidas para despertar o yin de sua natureza, tal como os velhos devem ser estimulados para desenvolver o seu yang e manter o equilíbrio.
Por isso o Tratado Interno dizia, sobre a preservação da vida: “Antigamente, as pessoas que compreendiam o Caminho, moldavam-se de acordo com o Yin e o Yang e viviam em harmonia com a natureza. Quem o fizesse, conseguia atingir a casa dos cem anos. Mas hoje, poucos o fazem”, o que significa: não é de hoje que as pessoas se perdem – incrível, porém, é que passado tanto tempo, elas continuam preferindo se perder.
Confúcio disse sobre sua vida: “aos quinze anos, orientei minha mente para aprender. Aos trinta, plantei meus pés com firmeza no chão. Aos quarenta, não tinha mais dúvidas. Aos cinqüenta, conheci a vontade do céu. Aos sessenta, meu ouvido retomou sua natureza. Aos setenta, sigo todos os desejos do meu coração sem transgredir nenhuma regra”, o que significa: o curso correto da vida é o estudo sobre ela mesma, o que leva uma pessoa a alcançar a sabedoria e uma prática adequada sobre a vida.
A vida é, até onde sabemos, uma só, e por isso deve ser vivida de modo feliz e em sua plenitude; por isso, devemos nos preparar, e manter nossa saúde, para os momentos de atribulação e desgaste, do mesmo modo que devemos nos exceder nos momentos apropriados para não criar uma tensão desnecessária.
Aquele que só se guarda, se apega de modo obsessivo ao corpo e não vive plenamente, por conseguinte, não se torna sábio nem tem nenhum tipo de experiência; o que só se excede renega o seu próprio corpo, queima rapidamente a vida e não alcança a sabedoria. Por isso, a vida é feita de momentos de alternância.
Diante da infinitude do universo, o tempo de uma vida é mais breve que um suspiro. O sábio a torna a chispa que acende uma fogueira. O tolo faz dela uma ladainha inútil de sentidos fúteis.
Diante da grandiosidade do universo, a intensidade de uma vida é tão profunda quanto uma oração. O sábio a torna uma realização da natureza. O estúpido, um atentado contra a mesma.
Esta é a primeira conclusão sobre o curso correto da vida.
Assim sendo, quando somos crianças, somos yang ascendente, estamos a desenvolver nosso potencial de vida, mas nada sabemos sobre ela (a vida).
Disse Wang Chong: “no céu ou na terra, não há nenhuma criatura que nasça sabendo”, o que significa: nesta primeira fase, precisamos estudar para aprender a viver; tomar consciência da própria vida; pôr o corpo em ordem e equilibrar o yin com o yang, por meio das retenções morais e físicas. Quando a raiz é forte, a árvore dobra, mas não quebra.
Assim é que disse Guanzi: “eduquem as criança para não precisar punir os adultos”, o que significa: neste momento é adequado construir a moral nos seres humanos. Não devemos, porém, impor ou simplesmente condicionar.
Como disse o Manual dos Ritos (Liji): “Não se procura a inclinação natural de cada um, e assim os estudantes são levados a fingir amor aos estudos, sem que nada se faça por explorar o que há de melhor em seus talentos”, o que significa: deve haver equilíbrio entre a vontade do indivíduo e sua construção como tal. Se o condicionarmos, ele perderá sua vontade e coragem próprias; se o deixarmos livre, ele crescerá em desordem. Por isso o sábio pondera sobre a questão e decide sobre o que é mais acertado para educar uma criança.
Mêncio disse: “grande é o homem que nunca perde o seu coração de criança”, o que significa: este conseguiu equilibrar suas tensões individuais, manteve sua personalidade e alcançou a sabedoria.
A fase da juventude (ou adolescência) é tão difícil quanto a velhice. Encontra-se aqui o yang pleno, e o foco está no excesso. Deve-se buscar uma ocupação ao jovem, ele deve ter um mestre e uma atividade. Sua mente se dispersa rápida e intensamente, seu coração pulsa como num eterno susto. Esta é a fase correta para exceder-se, despertando a vinda de yin. Em plena força, pois, não se pode submeter um jovem pela mesma força. É hora de orientá-lo, deixar errar e estimulá-lo ao correto. Só assim ele poderá descobrir o mundo de modo sadio, e não se arrepender do que não fez, buscando o que é impróprio fora de época.
A época adulta é o momento crucial da vida, quando yin finalmente desperta e yang começa a decair. Nesta época, tudo é propício à reflexão correta, ao estudo aprofundado e ao trabalho dignificante. O caminho da sabedoria se abre e se fortalece no coração e na mente. Aquele que entra nesta fase de modo correto encontra a realização pessoal; muito, porém, em função de uma infância ou juventude ruins, continuam a tentar manter hábitos incompatíveis. Deve-se tomar cuidado para que isto não seja o início da tolice. Este é o tempo dos grandes estudos, e aqui o indivíduo define o que ele mesmo deseja ser e fazer de si mesmo.
A fase madura consiste no aprofundamento do yin. A energia yang começa a esvair-se, e devemos estimular o corpo a se manter em ordem, evitando assim a desagregação. Nossa mente e responsabilidades se aprofundam; neste momento, escolhemos nossos hábitos, nos deparamos com nossos limites naturais e descobrimos o prazer da integração de nós mesmos com a natureza. Quem, neste momento, percebe isso, está no caminho correto, envelhece bem, administra suas forças e segue adiante com autoridade. Os que se apegam obsessivamente ao corpo, porém, se desiludem, sofrem, e sua ignorância lhes dá desespero. Os erros do passado cobram seu tributo. Mas sempre, no entanto, podemos buscar nos redimir.
Disse Confúcio: O homem superior, quando há algo que não estudou, ou quando, no que estudou, algo existe que não pode compreender, não interrompe o trabalho. Quando há algo que não investigou ou no que investigou, algo existe que ele não sabe, não interrompe o trabalho. Quando há algo ainda por meditar ou naquilo que meditou há algo que não compreende, não interrompe o trabalho. Quando há algo que não discerniu ou não pode dis¬cernir claramente, não interrompe o trabalho. Se algo existe que não praticou ou cuja prática carece de seriedade, não interrompe o trabalho. Se outro homem consegue êxito mediante um esforço, ele utilizará uma centena de esforços. Se outro homem alcança êxito mediante dez esforços, ele utilizará mil esforços. Deixai um homem proceder desse modo e, ainda que seja duro de entendimento, certamente se tornará inteligente, ainda que seja fraco, certamente chegará a ser forte”, o que significa: importa nossa atitude sincera em busca da sabedoria. O resto vem naturalmente. Mas quanto mais cedo iniciarmos, melhor.
A velhice é a sagração do ancião sábio, e a desgraça do teimoso renitente. É o momento do yin pleno, promovendo a estagnação e a desagregação da ordem. O ancião sábio conquista seu lugar no banquete, como diz “O Justo Meio”; “é oferecido um banquete em separado para os mais velhos, a fim de reconhecer o princípio de ancestralidade de sua idade”. O tolo, porém, se apega a sua estupidez, insiste nos velhos erros e é desprezado por sua intransigência. Na antiguidade, uma longa vida podia significar “harmonia com a natureza”, e por isso acreditava-se que os anciãos de grande idade adquiriram alguma sabedoria. Os anciãos sábios são aqueles que estudaram a vida, formaram princípios inflexíveis, mas são adaptáveis ao meio e são sensíveis às pessoas.
Os senis são aqueles que negam a velhice, buscam aparatos externos para compensar seu vazio interior, não construíram princípios corretos e agem sempre do mesmo modo; de acordo com as circunstâncias, buscam proveito pessoal e a manutenção de seu erro. Por isso Confúcio disse: "Um jovem que não respeita os mais velhos nada conquistará quando crescer e tentará até esquivar-se da morte quando alcançar a velhice: ele é um parasita", o que significa: triste é a sina daquele que não buscou a sabedoria, pois sofrerá na velhice.
Confúcio disse: "Um cavalheiro tem de se guardar contra três perigos. Na juventude, quando a energia do sangue ainda está alvoroçada, ele deve guardar-se contra a volúpia. Na maturidade, quando a energia do sangue está no seu apogeu, ele deve guardar-se contra a raiva. Na velhice, quando a energia do sangue está em descenso, ele deve guardar-se contra a rapacidade", o que significa; tudo, enfim, tem sua época. É natural do humano o desejo sexual, a ira e a busca de conforto; fazê-lo sabiamente é o acertado; de modo desregrado ou inconseqüente, é a oportunidade para a decepção.
Aquele que atingiu a sabedoria cerra os olhos dessa vida certo de que a viveu o quanto podia, e fez o quanto deveria. Confúcio lamentou-se, perto da morte, dizendo: "O Fênix não vem, o Rio não revela nenhum mapa. Está tudo terminado para mim!", o que significa: devemos tentar seguir o curso correto da vida, até o fim, pois este é justamente o sentido da vida correta. Mas os que lamentam pelos erros cometidos ou não cometidos, ou ainda, que se julgam tranqüilos porque abençoados por algum motivo estranho à razão (mas claro ao sentido de seus desejos egoístas), este não fragmenta seu espírito nem lega posteridade. O destino do renitente é o desconhecimento; e o céu o aproveitará como deve ser feito, transformando-o em esterco. Assim é que, na hora de morte, lamenta ou ri o sábio porque sabe o que fez; o ignorante lamenta porque não aproveitou o quanto queria, ou se crê perfeito em sua ignorância; só sabemos a diferença pela angústia - porque o sábio vai embora tranqüilo, em qualquer uma das situações, enquanto o tolo nunca aceita seu destino e procrastina em sua burrice. Aqueles que, por acidentes da vida, não puderam cumprir devidamente com estes ciclos, tem sua chance no momento da descoberta do caminho, e na ação de pô-lo em prática.
Esta é a segunda conclusão deste Tratado.
Em todos os tempos, os sábios consultaram o Tratado das Mutações para desvendar o que está oculto e compreender o fluxo da natureza. Ao vislumbrar as fases da vida, o sábio busca, pois, estar em harmonia com a natureza, prolongando sua vida não apenas pelo corpo físico, mas pela oportunidade de descobrir a sabedoria.
Somente nossa mente pode dizer quem nós realmente somos. O nome de alguém, por exemplo, é dado ao seu corpo, que muda ao longo da vida; não deveria, então, mudar o nome desta pessoa? Se nossa inteligência igualmente evolui, então ela também não nos representa; concluímos assim que: adotamos um nome a estudamos o mundo, mas somente nós mesmos sabemos quem somos, e mais ninguém. Isso é a mente. Eu sou minha mente.
Assim sendo, a manutenção da mente se dá pelo estudo; a do físico, por meio das três disciplinas do corpo, que são:
- A medicina, que é externa a nós, e que nos põe em ordem por meio da força. Por isso que se diz: a medicina nos corrige, mas não nos educa.
- A educação corporal, interna a nós, que nos põe em ordem por meio de nossa vontade em alcançá-la. A educação corporal pode nos corrigir, e até mesmo nos educar, harmonizando as energias e prolongando a vida.
- A prática consciente do sexo, que harmoniza as pessoas por meio do movimento interno e externo. O sexo educa e corrige; educa por que aquele que o busca de modo sincero, deseja proporcionar o melhor ao seu parceiro; e corrige, porque nos faz conhecer melhor não só o nosso corpo e espírito como também, o corpo e espírito dos outros. Assim, a prática correta do sexo estimula yin e yang, e sua harmonização. Disse o Tratado Íntimo: “A causa da fraqueza das pessoas está somente no fato de que aproveitam de forma abusiva de todos os caminhos do relacionamento entre os elementos feminino e masculino. Neste ponto, yin é superior a yang, da mesma forma quando o fogo é apagado pela água. Se você compreende isso e sabe aplicá-lo, você se parecerá com as panelas apoiadas num tripé, em que são combinadas harmonicamente as cinco tendências do paladar, fazendo com que surja uma sopa deliciosa de carne e legumes. Quem está bem informado sobre os caminhos dos elementos yin e yang desfrutará os cinco prazeres; quem não os conhece e não segue, encurtará a própria vida. Quantos prazeres e alegrias ainda podem ser desfrutados! quem não dedicaria atenção a isso?”, o que significa: o yang deve buscar despertar o yang em seu parceiro; yin deve transmitir seu yin para o seu parceiro. É assim, pois, que o yang tenta se prolongar o máximo para despertar o yang de seu parceiro; e yin tenta alcançar o clímax o mais rápido possível para promover o yin de se parceiro. Seja qual for o par, essa regra vale para qualquer sexo interessado na harmonia final resultante desta relação. Deve-se ter em mente, portanto, apenas quem é o yin e quem é o yang; e o revezamento é tão possível quanto é a vontade e a atitude.
Em tudo, pois, deve-se buscar a justa medida, sem o que o corpo não vive ou se desgasta. Deve-se buscar, igualmente, estudá-las para melhor entendê-las e praticá-las. Isto prova que o estudo da mente ajuda o corpo; um bom corpo pode, também, ajudar a mente. A natureza pode compensar um corpo ruim com uma mente brilhante; e um corpo perfeito com uma mente obtusa. Por isso que, muitas vezes, onda há beleza física, não há profundidade mental. Muitos se julgam inteligentes também; porém, só o fazem apenas porque não possuem um bom corpo. Estes erram duas vezes.
O sábio segue a seguinte regra, contada numa antiga fábula chinesa: um mestre, ao ser perguntado sobre qual era o modo correto de viver a vida, respondeu: “coma quando tem fome; durma quando tem sono; pense quando pode pensar. Seu discípulo riu e respondeu: “mas todos sabem disso”, ao que o mestre respondeu: “sim, mas quem o faz?”, o que significa: poucas conseguem descobrir o ritmo da vida, e o sábio é aquele que torna o óbvio acessível à todos.
Ao seguir suas propensões, pois, o sábio descobre seu ritmo; a saber seu ritmo, descobre como se harmonizar com a natureza; ao entrar em harmonia, ele se descobre vivo e, então, pode atingir a sabedoria.
Esta é a terceira conclusão deste Tratado.
Li – Li – Li (理力禮, em qualquer ordem), o que significa:
O ritual é a força do princípio;
O ritual é o princípio da força;
O princípio é a força do ritual;
O princípio é o ritual da força;
A força é o ritual do princípio;
A força é o princípio do ritual;
Que significam, todos: que a vida correta só pode ser alcançada por meio de três coisas, a saber: um princípio para tudo; um modo de executá-lo, que é o ritual; e a força e coragem, necessárias para pô-las em prática. Os três se engendram, se constroem e, sem um deles, os outros nada são. Assim, o sábio vislumbra as fases da vida, infere os meios apropriados de mantê-la e vivê-la, e os põe em prática. Ele pondera, infere a justa medida e as realiza.
Esta é a conclusão deste Tratado.
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