O tudo pertence ao infinito.
Logo, criação e destruição pertencem ao finito.
O principio é, pois, parte do infinito; a matéria, do finito.
Todos os caminhos que apregoam o início e o fim do universo baseiam-se no finito. Assim, eles se atêm ao mundo da mutação, e não dos princípios. Dito isso, as vias múltiplas são válidas para moldar a conduta dos seres humanos, mas não para desvendá-lo. Por esta razão que existem caminhos apropriados e caminhos não apropriados para se seguir.
Céu e a Terra abrigam em si toda a natureza. Suas regras se manifestam ao ser humano, e o mesmo tenta classificá-las segundo uma crença que julga ser o entendimento do principio. Ao fazê-lo, ele cria uma imagem do principio, mas não o principio em si. Eis a razão pela qual existem tantas vias, métodos e caminhos, cada um crendo ser mais verdadeiro que o outro. Isso é errado. O sábio pondera sobre o que é mais adequado, analisa se uma via é válida e assim, permite-se julgá-la ou não. O tolo a segue fanaticamente, por não ter ou não querer repensá-la em seus defeitos. Essa é a origem de muitos males. Por isso Confúcio disse: “como servir aos mortos, se não sabemos servir aos vivos?”, o que significa: qualquer caminho que desperdice o ser humano não é apropriado.
O desafio do ciclo da existência é a razão que move grande parte dos caminhos que pretendem entender o principio do celeste. Mas, elas pretendem compreender o imutável e infinito pelo mutável e finito. Este é outro erro. Por isso, suas conclusões, em geral, são difíceis de sustentar.
Por outro lado, a dificuldade em acessar o infinito não pode prescindir da ação no finito. Por esta razão, as vias acabam sendo reflexos pálidos do caminho do céu, mas são válidas enquanto tornam as pessoas melhores. Assim sendo, o céu espalha então suas virtudes pelas civilizações humanas, e lhes abre as portas da compreensão para além do finito.
Um sábio, portanto, reconhece a validez de um caminho pelo seguinte critério: se uma via propõe a criação e a manutenção de uma ordem baseada e em harmonia com a natureza; se esta ordem promove a paz entre as pessoas, e educa as crianças a tolerância, estudo e a continuidade; se promove o autocontrole, por meio da justa medida das coisas; se preserva a vida, incita a paz e favorece o entendimento, e aceita a realidade múltipla de todas as outras vias, então, esta via pode ser apropriada.
Se um caminho, porém, não propõe uma ordem de acordo com a natureza, e coloca o ser humano no centro de tudo; se não enseja a preservação da vida; se prega a existência de uma verdade que exclui todas as outras; se não defende o auto-controle; se a justa medida é pautada em critérios alheios ao ser humano; e por fim, se crê ser a única via aceitável, negando a existência de outras, então, esta via não é apropriada.
Confúcio disse: “entre os quatro mares, somos todos irmãos”, o que significa: não há lugar no mundo onde os caminhos não surjam, e todos eles levam, num primeiro momento, a constatarmos que somos humanos e irmãos. Somos iguais em principio e diferentes em manifestação – pois o que nos rege é imutável e infinito, mas a manifestação se dá no mutável e finito. Assim sendo, se somos criados pelos principio, então somos mais próximos do que distantes, e tudo que for parte do caminho dos caminhos nos é acessível.
Este é o caminho do céu. É o caminho dos caminhos para o caminho. Nada mais precisa ser dito sobre isso.
Esta é a primeira conclusão deste Tratado.
Os caminhos para o caminho do céu surgiram nos tempos antigos.
Naquela época, as pessoas não conheciam seus sonhos, e por isso pensavam que, ao sonhar, eram uma outra pessoa dentro de um corpo. Este foi o começo. Transformaram o principio de ser humano na idéia de alma, e assim o acreditam até agora.
Nos tempos antigos, as pessoas começaram então a buscar as almas das coisas. Olharam para a natureza e começaram a nomear suas forças e objetos como divindades. Este foi o início. Depois, quando os seres humanos começaram a entender que podiam alterar a natureza, controlar as águas e aprender os ciclos, suas divindades começaram a ganhar contornos humanos. Receberam corpos humanos e cabeças de animal, ou tinham corpos animais e rostos humanos. Quando as pessoas julgaram conhecer as leis da natureza, e supuseram estar essa sob seu controle, seus deuses ganharam formas totalmente humanas, e possuíam, inclusive, os mesmos sentimentos destes. Mas as pessoas se desiludiram quando viram que suas ciências não eram suficientes para captar a concepção que tinham das divindades, e por isso começaram a lhes dar outras formas indizíveis.
Por esta razão Confúcio sabiamente se dirigiu "ao céu", pois sabia que nomear o infinito com nomes do finito seria sempre um erro.
Do mesmo modo, no início, as pessoas tinham muitas divindades, cada qual representando uma força da natureza. Depois, escolheram algumas dessas forças que julgavam principais, deram-lhes particularidades humanas, e criaram grupos de divindades que julgavam especiais. No entanto, com o passar do tempo, as pessoas se sentiram distantes de suas divindades e da natureza, e por esta razão, buscaram uma divindade em especial para dedicar-se, ainda que as outras existissem. Isso não foi o bastante, porém. Com o passar dos séculos, os humanos começaram a acreditar em uma única divindade, que anulou todas as outras. No entanto, como poucos dizem ter acesso a ela, o sentimento de distancia continuou, e por isso, muitos deixaram de praticar a via do céu, bem como outros concluíram que o céu a tudo engloba, não sendo um, mas apenas sendo.
Por esta razão Confúcio se dirigia ao céu. Porque o céu é a natureza. A natureza é o universo. E o universo tem suas leis, com o qual o sábio busca se harmonizar. Como o universo é regido por princípios, então, o universo é o infinito, sem fim nem começo. O inicio e o fim são buscas no finito. Logo, aquele que prende a via do céu no finito comete um erro; o sábio busca compreender a via do céu no infinito, e por isso é bem sucedido em suas ponderações. Eis porque se diz: antigamente, as pessoas podiam explicar o caminho, mas não podiam compreendê-lo; hoje, as pessoas podem compreendê-lo, mas não sabem explicá-lo.
Os sábios surgiram no mundo para harmonizar esta tensão, e traduzi-las para o mundo.
Esta é a segunda conclusão deste Tratado.
O que é infinito e mutável é o principio; a matéria é finita e mutável. Alguns acreditaram, porém, que quanto mais pudéssemos harmonizar a matéria com o principio, mais poderíamos manter a existência do corpo. Este foi o principio da concepção de imortalidade.
Baseando-se na medicina, que prolonga o corpo por meio de remédios, imaginou-se que poderia ser possível evitar a degeneração da matéria por meio de uma harmonia total entre ela e o principio.
Ora, aqueles que afirmam isso ignoram por completo a finitude da matéria. Remédios, exercícios e a pratica ritual do sexo são meio físicos, e como tal, só atuam sobre o físico. Por isso, seus resultados podem ser bons, mas são finitos, tal como é a matéria em que atuam. Não é possível qualquer tipo de imortalidade do corpo.
Porem, tal como yin e yang, se acreditarmos que o corpo é a manifestação de um principio, por conseguinte, podemos admitir então que este princípio que se manifesta pode ser imutável e infinito. No entanto, o contrario da matéria é a "não matéria", ou vazio. Como pode então o vazio ser o principio, se ele nada for? Assim sendo, pode ser o espírito, alma, principio ou como queiramos designá-lo um outro tipo de substancia? Pois, se o for, seriam, a princípio, finitos. Ou então, pertencem a uma outra categoria de coisas que não podemos acessar pois fazem parte, justamente, do infinito. Para que exista ordem na matéria, é necessário um principio; e só sabemos que existem princípios porque eles se manifestam na matéria e lhe dão padrão, forma e sentido. Assim sendo, um não existe sem o outro, tal como yin e yang; e um mesmo principio pode se manifestar várias vezes na matéria, o que lhe da o seu caráter de infinitude.
Por isso, o sábio pondera sobre estas coisas e decide sobre o que é mais acertado. As respostas são o alicerce das vias que conduzem a via do céu.
Esta é a terceira conclusão deste Tratado.
Sobre os ancestrais e sua veneração, deve ser dito o seguinte: eles são os modelos de exemplo, e graças a eles estamos presentes neste momento, possuindo uma existência. No entanto, se o veneramos como âncoras que tornam nosso pouso seguro, não poderemos mais navegar; se os desprezarmos como um livro antigo, repetiremos velhos erros, sobre os quais já nos avisavam.
Assim, o sábio se inspira nas atitudes dos ancestrais, e venera sua sabedoria que se atem ao principio. Mas ele vive o dia de hoje, e seu momento é agora. Busca a imortalidade de seu nome e de sua sabedoria, mas não a do corpo. O sábio é sua mente. Nós somos nossa mente, e é o que podemos saber sobre isso agora.
Esta é a conclusão deste Tratado.
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