Apologia da Preguiça


Poema sobre o estudo
Em minha juventude eu buscava mostrar plenamente meus talentos, dia e noite tratava de me aperfeiçoar. Agora me sinto feliz na preguiça, e passo dias inteiros sem fazer nada. Que ignorância a minha! Abandono sem retorno a via da sabedoria e ainda me comprazo na minha baixeza!
Hanyu

Confúcio buscou a vida inteira servir a um grande governante, de modo à por seus projetos em andamento e poder servir ao mundo dignamente. Quando viu que nenhum deles lhe dava respaldo, largou tudo e foi cuidar dos alunos. Mesmo assim, não o deixavam em paz, e mesmo seus discípulos tinham que aturar os ignorantes atrevidos. Muitas vezes, o que o mestre queria era viver num mundo em que se pudesse tomar uns goles, ouvir música, nadar numa cachoeira e estar pronto para o trabalho no dia seguinte. Hanyu sabia disso quando escreveu seu poema sobre o estudo. De fato, cansamos às vezes de lutar pelo que é correto; revelamos crimes, apresentamos as conspirações e os equívocos daqueles que agem de modo escuso, sofremos intimamente com nossos erros e falhas pessoais, e nos parece que todo nosso esforço resulta em algo inútil. Confúcio também pensava assim, e ocasionalmente abandonava seus trabalhos e se mudava, quando via que seus projetos não iriam adiante. Mas e o dao do estudo? Então, ele pode ser abandonado? Aquele que estuda sabe que não. Hanyu nos instiga a reflexão quando ironiza com sua velhice. A questão é que nos cansamos em certas ocasiões. Preferimos ficar debaixo dos lençóis do que sair para a rua; mesmo o tempo nos mostra que, em certas ocasiões, é melhor não insistir com um povo que se compraz em sua estupidez, liderados por idiotas convictos de seu suposto saber. Nestes casos, é mais apropriado dormir mesmo, ler o que se gosta e escrever quando se tem vontade. Há momentos em que abrir a boca é correr o risco de apanhar; mesmo Hanfei, o gago maligno de Qin dizia que "aquele que critica os governantes carrega seu caixão debaixo do braço". Cabe a um sábio lutar contra o que está errado sim, mas até isso tem limite - é quando luta-se por gente que não compreende o que é bom pra si mesmo. Nestas estações, é mais acertado deixar as coisas correrem sozinhas, e dedicar-se ao cultivo intimo. O sábio, como sabemos, atua no vazio. Nada melhor do que a apologia da preguiça para que ele - o sábio - seja deixado em paz.

Mêncio disse: “enquanto vamos caminhando, temos de nos virar para procurar a nós mesmos”.

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