A Questão dos Direitos Humanos numa Perspectiva Oriental - 2001

A questão dos direitos humanos é um dos temas mais recorrentes em todas as pautas de negociações que envolvem as discussões sobre a “nova ordem mundial”. Criação euro-americana (o que é, no mínimo, uma ironia, tendo em vista que foram os mesmos que estruturaram o colonialismo moderno), os direitos humanos tem sido pregados como a salvação universal contra regimes antidemocráticos e contra o monopólio da violência pelo Estado, através do reconhecimento por lei do direito de liberdade e expressão do indivíduo.

Infelizmente, isso parece uma ficção longe de ser alcançada, tendo em vista que nos lugares onde estas mesmas idéias de igualdade e fraternidade foram aceitas e difundidas, subsiste ainda a pobreza, a repressão, a ignorância...Enfim, uma série de males para os quais havia sido criada esta proposta inovadora, síntese das idéias de liberdade geradas em um mundo ocidental e civilizado.

O que há de errado com a proposta dos direitos humanos? Se ela é perfeita, e universal, porque nem todos os povos do mundo puderam compreende-la e aceita-la, tendo em vista as melhorias substanciais de qualidade de vida que poderiam advir da sua prática? O que trava sua aplicabilidade no cotidiano é tão somente o interesse de grupos restritos da elite, que administram seu poder através da corrupção do sistema social, ou o código dos direitos humanos parece se tratar de um projeto idealístico cuja leitura é de difícil acesso?

Nesta comunicação, apresentaremos uma interessante leitura acerca dos direitos humanos promovida por uma série de autores orientais cuja discussão filosófica em torno do tema nos obriga a uma revisão do discurso existente a respeito desta questão, sobre o seu alcance e aplicabilidade.

A Universalidade dos direitos humanos.
A primeira questão que pode ser colocada é: os direitos humanos representam realmente uma proposta de caráter universal? De certa forma podemos afirmar que sim, já que este código surgiu com tal premissa. O problema que aí se insere é se o conjunto dos direitos humanos têm, ou não, a possibilidade de serem aceitos como universais.

Vejamos: num interessante artigo escrito em 1983, o pensador indo-espanhol R. Panikkar[1] reascendeu a questão da universalidade da proposta dos direitos humanos contrapondo-a com o pensamento indiano clássico. Seremos mais abrangentes aqui, utilizando também considerações dos sistemas clássicos de pensamento chinês para referendar nossas considerações.

A análise apresentada por Panikkar demonstrava o quanto, realmente, estamos distantes de compreender a realidade que cerca a composição deste discurso. Em primeiro lugar, aceitamos as idéias dos direitos humanos como algo universal, uma formulação perfeita sobre os direitos de liberdade do seu humano. Assim sendo, nosso primeiro erro é o de admitir, sem discussão, que toda e qualquer nação que aparentemente viole os direitos humanos é uma nação desprovida de civilidade, tida como atrasada ou culturalmente ignorante.

Sem perceber, manifestamos aí a velha questão do preconceito cultural eurocentrista, que nos induz a não admitir qualquer coisa fora do nosso “normal” como cultura, mesmo que isso seja resultante de uma má leitura da mentalidade do outro, ou mesmo uma manipulação da mídia em torno do “diferente e exótico” o que, convenhamos, é um de seus motes de audiência[2].

Por conseguinte, ficamos chocados com imagens de violência vindas da África ou Ásia, acreditando que estes continentes são compostos de gente estranha e pouco civilizada. O mesmo pode ser dito a respeito de hábitos cotidianos e religiosos, tidos como exóticos e desprovidos de razão. Se isso não fosse somente uma mistura de estereótipos e preconceitos da pior espécie, o mínimo que um leitor atento poderia fazer, antes de realizar qualquer julgamento, é se perguntar se sua sociedade não tem também problemas, hábitos ou costumes do mesmo gênero que ele próprio não compreende; segundo, que a estranheza do Ocidente pelo Oriente é recíproca, e sem diálogo o outro sempre parecerá um estranho; e por fim, que o referencial de correto que ele tem é apenas o de sua cultura, o que não o torna em nada um observador mais ou menos capacitado para analisar outros sistemas culturais. As discussões sobre as possibilidades que um elemento de uma determinada sociedade tem de compreender outro grupo é um dos temas preferidos da antropologia ocidental, no qual não nos deteremos, porém, em função de nossa proposta inicial[3].

O fato é que a idéia dos direitos humanos parece ser um consenso ideal sobre o modo de administrar o mundo segundo um critério liberal e individualista. Ela é resultante de dois momentos históricos fortes: a revolução francesa e a proclamação da ONU em 1948. Analisemos inicialmente o caso da França dos séculos XVIII - XIX[4].

Se considerarmos que a proposta dos direitos humanos pode ser universal, devemos nos questionar, portanto, se os franceses da época conseguiram, mediante um processo de interação com uma série de problemáticas específicas, inferir um código de caráter universal que sirva a todos os seres humanos, culturas e sociedades. Logo, o que estes franceses fizeram foi estabelecer um sistema que automaticamente coloca a Europa no topo de uma hierarquia cultural mundial, demonstrando uma teórica incapacidade das outras civilizações em descobrir o mesmo através de suas racionalidades “inferiores”.[5]

Admitindo isso, seríamos forçados a concluir que este momento foi único na História, pois ocorreu a formulação de uma idéia capaz de extrapolar qualquer barreira cultural, acessível a todos os grupos humanos. Mas a pergunta que se faz é a seguinte: se os direitos humanos são universais, e por conseqüência, resultam da apreciação profunda da identidade do ser humano, então, porque nem todas as culturas conseguem compreende-lo de forma simples? Alias, se tal inferência foi feita tendo por base a relação do ser humano com seu mundo, ela não poderia ser alcançada por outras culturas? E se o foi, porque então essas culturas não propuseram sistemas que, em seu íntimo, fossem totalmente universalistas?

Essa é uma questão complicada, que se remete ao problema da definição do ser humano em si. O código dos direitos humanos estabelece um paradoxo flagrante: admitindo-o, estaremos aceitando também que existe uma hierarquia de culturas, e conseqüentemente, uma diferença entre os seres humanos[6]. Pior do que isso, damos base à idéia de que existem grupos que precisam ser “educados” culturalmente (ou seja, imposição de valores) e ainda assim, nada garante que os mesmos assimilem os conceitos de igualdade que o Ocidente os propõe. Parece absurdo, mas neste ponto o código dos direitos humanos praticamente ratifica a diferença, promovendo a necessidade da civilização moderna de impor suas ideologias.

Por outro lado, se esta mesma proposta admite que os seres humanos são iguais entre si, logo, todas as sociedades do mundo - como foi dito anteriormente - poderiam entender as propostas de liberdade e igualdade contidas nos direitos humanos. Mas se isso não ocorre, temos que admitir aí alguns fatores fundamentais para discussão do tema.

O primeiro deles é: sendo os seres humanos iguais, então eles podem concluir as mesmas coisas a respeito de sua relação com a natureza universal, e, por conseguinte, inferir códigos semelhantes de ética e conduta, mesmo que em épocas diferentes da história de cada um.

Este questionamento é importante. Como disse o pensador chinês W. T. Chan[7], o Ocidente muito pouco conhece do pensamento oriental para saber o que a Ásia produziu em termos de conceituação teórica, cultura, saber, etc. isso nos remete a possibilidade dos orientais já terem concluído pontos semelhantes aos que fundamentam o código dos direitos humanos bem antes dos europeus - e mesmo assim, terminaram por elaborar sistemas lógicos completamente diferentes daqueles que conhecemos.

Podemos citar como exemplos alguns trechos do pensamento oriental clássico para exemplificarmos esta idéia.

Em primeiro lugar, haveria uma única realidade da qual todos derivamos. Este axioma não se baseia em nenhum sistema complexo de criação (A Índia possuía vários mitos criadores, em contraposição a China, uma das poucas, ou talvez única, que não possuía nenhum, tendo absorvido ou criado alguns apenas em períodos tardios[8]) mas sim, no fato de que a única realidade presente e observável é a da natureza, onde tudo é mutável, e nada escapa ao ciclo de nascimento, vida e destruição. Todo e qualquer ser está inserido neste sistema. Tal lógica já aparece em escritos antigos da China tal como o Yi Jing[9] ou mesmo na Índia, através dos Upanishads[10], situados em torno do período dos séculos IX - VIII a.C.

O Taoísmo chinês lidou com esta com esta perspectiva de modo brilhante e singular. Lao zi[11] teria deixado claro, no seu Dao De Jing[12], que todos os seres provém de uma única fonte, e por isso são iguais perante a natureza. No entanto, tal como a mesma natureza os diferenciou segundo sua vontade, cada ser tem uma particularidade específica. Isso não torna um ser mais importante que outro, mas apenas varia a função de cada um em relação ao cosmo, ponto que Zhuang Zi[13] destacaria em uma de suas fábulas.

Se isso já não bastasse para provar que os chineses antigos podiam pensar em igualdade (mesmo que essa igualdade tornasse os seres diferentes), alguns outros autores defenderam a idéia de uma paridade total entre os seres. Mozi[14], por exemplo, acreditava num mundo sem escravos nem senhores. Todos seriam literalmente iguais, numa sociedade ideal de caráter comunal, pacífica e religiosa. E isso Mozi concluiu tendo por base os conflitos de sua época e uma noção bem específica de Natureza e de Céu (Tien), o que em muito o diferenciava dos franceses cristãos do século XVIII.

Mas foi Confúcio que deu um nó na cabeça de muitos missionários católicos e protestantes que foram até a China. Criador de um sistema filosófico que defendia a importância do ensino, da cultura e do respeito mútuo[15], este grande pensador do século VI a.C. crivou sentenças que fazem pasmar os indivíduos mais céticos, tais como: “não faça aos outros o que não queres que lhe façam”[16]; “ame a todos, sem distinção”[17]. Como se não bastasse, este partidário da educação pública defendia que todos tivessem acesso aos saberes, o que possibilitaria uma sociedade igualitária: “numa sociedade instruída, não existem diferenças entre os seres”[18] e também “sem princípios comuns, é inútil discutir”[19].

O caso indiano também não fica distante: se analisarmos os primeiros escritos relacionados ao Budismo[20], veremos que a igualdade e a fraternidade eram uma constante nos discursos dessa religião - filosofia, sendo que o mesmo ocorria no Jainismo de Mahavira[21]. Em compensação, os hinduístas tradicionais acreditavam que a desigualdade social era justamente um fator natural, derivado dos momentos de criação e pautados num critério reencarnacionista[22].

Esta clivagem nos remete a um segundo questionamento mais amplo: será difícil crermos que estes autores antiqüíssimos, colhidos a título de ilustração, não teriam postulado uma proposta de igualdade universalista? E por isso mesmo, por que suas idéias nos parecem tão estranhas? Porque suas conclusões são tão diferentes? Porque elas sofreram a ação do tempo e também foram deformadas em suas raízes?[23]

A resposta parece residir numa questão muito simples, mas que deve ser revista de forma mais profunda; a questão da Cultura. Parece óbvio que nos remetamos a esta idéia para explicar as diferenças de perspectiva que os orientais possuem em relação às noções de igualdade entre os seres, mas até então, temos tido a expectativa de que, mesmo sendo diferentes de nós, eles poderiam entender e absorver a nossa proposta de direitos humanos porque ela seria melhor para todos.

O potencial de atrito que reside neste posicionamento está pautado na estruturação dos sistemas sociais orientais que, com muita dificuldade (ou com extrema ingenuidade) costumamos a analisar e aceitar (quando aceitamos)[24]. Tomemos como exemplo a noção de individualismo ocidental em contraposição ao forte senso gregário dos chineses e indianos: enquanto na primeira noção a afirmação do indivíduo sobre a sociedade é uma meta primordial, na segunda, a vinculação do individuo com a família é o fator determinante de sua formação moral e social. Logo, no Ocidente a questão da Liberdade é tratada numa tendência egoística e antropocêntrica concentrada do indivíduo, mas, na Ásia, a restrição íntima do individualismo é considerada a base desta mesma liberdade social, através do equilíbrio comunitário[25].

Isso não quer dizer que a mentalidade oriental é pior, ou melhor, do que a ocidental. Até recentemente as famílias tradicionais das Américas e da Europa também influenciavam a vida de suas comunidades através das restrições matrimonias, do monopólio do poder sobre os filhos, etc. Igualmente, os orientais tiveram suas experiências libertarias e individualistas. O que caracteriza a diferenciação atual é o fato do discurso ocidental se entender como o mais adequado para a resolução deste impasses, o que gera ainda mais atritos entre estas ditas concepções “modernas” (ocidentais) e “conservadoras” (orientais).

Tal consideração ficou clara na declaração dos direitos humanos feita pela ONU em 1948[26]. Num grande passo para a formação de um mundo mais justo, os bem intencionados delegados da assembléia entenderam que seria adequado revalidar esta proposta como diretriz básica de entendimento entre os povos e sociedades. Só esqueceram de perguntar o que as nações da Ásia e da África achavam disso: mas elas não estavam ainda em condições de responder, e prevaleceu novamente a hierarquia cultural ocidental como referencial de discussão. O que se seguiu, nós sabemos: mais guerras, ditaduras e revoluções, tanto em nome da democracia como contra ela.

A corrupção política e os interesses econômicos ainda são grandes entraves para aplicação de toda e qualquer forma de sistema social mais justo. O problema, porém, é que estes sistemas não têm sido planejados de acordo com as variações culturais existentes entre as sociedades. Eis, aí, um dos pontos que os autores orientais tem trabalhado bastante no sentido de resolver.

A questão dos sistemas culturais e de pensamento.
A cultura tem sido entendida, tanto na China como na Índia, como uma variação técnica da necessidade de adaptação ao meio por parte do ser humano. Ela é entendida como uma produção dicotômica, tendo em vista que ao mesmo tempo é algo natural da evolução do ser (sua capacidade de adaptação) e ao mesmo tempo não natural, na medida em que destaca o ser do seu meio.

Cada sociedade produziu uma cultura específica pela ânsia de respostas aos mesmos problemas, mas em interação com ambientes diferentes. Logo, isso nos remete a idéia constante de que todos os seres são iguais, mas cada um tem seu próprio espaço e, por conseguinte, cada um desenvolve a melhor forma de viver nele.

Isso, porém, não quer dizer que os orientais acreditassem sempre que o meio fazia a pessoa: ele o influenciava, com certeza, mas todos possuem a capacidade de mudar o seu destino. Assim, a cultura é vista, portanto, como a melhor forma de interagir com o ambiente: e no momento que ela atinge sua conformação ideal, ela pode ser modificada de acordo com a necessidade, mantida como padrão ou cair em desuso, caso os novos tempos o exijam.

Estas definições nos fazem compreender que o Oriente, em certa medida, foi forçado a abandonar seu antropocentrismo clássico em virtude dos tempos de dominação colonial. Concomitantemente, o imperialismo acirrou a xenofobia, mas deu margem à que os grupos intelectualizados pudessem pensar o relativismo cultural como um fator de diferenciação profundo, causador de barreiras mentais que terminariam sempre por provocar os conflitos existentes no mundo.

A questão da igualdade, portanto, não é uma premissa ocidental, mas universal. A forma de aplica-la, porém, é que tem variado durante os séculos (seja no formato religioso, legal, político, etc), e o fator cultural ainda não foi devidamente trabalhado para que haja um consenso sobre como estabelecer um critério de paridade entre as civilizações. Talvez devido aos tempos de invasão e repressão estrangeira, alguns orientais têm pensado em formas de administrar estes problemas baseados em suas experiências com o assunto.

Soluções possíveis.
No aspecto cultural e filosófico, a compreensão dos códigos sociais e éticos das sociedades passa pela necessidade de uma tradução mais ampla, tanto lingüística quando comunicativa.

Já notamos desde muito a ampla necessidade que temos de conhecer um pouco mais sobre o oriente antes e fazermos qualquer avaliação de sua cultura. A língua chinesa, por exemplo, é a mais falada do mundo: e, no entanto, quantos de nós passamos a vida toda sem conhecer uma única expressão desta língua? O Hinduismo e o Islamismo são religiões que congregam tantos crentes como o Cristianismo: e o que conhecemos destes sistemas religiosos? Alias, porque o hinduísmo, uma religião mais antiga do que qualquer outra no mundo moderno, é tratado como Mitologia, ou seja, desprovida de uma realidade histórica? J. Ching[27] precisou escrever um artigo específico sobre o assunto para provar que os chineses tinham senso religioso, apenas porque o padrão monoteísta judaico-cristão era, em sua época (como até hoje em muitos casos) a referência de discussão do assunto.

Estas discrepâncias subsistem devido ao desconhecimento. No entanto, sua apresentação pura e simples não é suficiente para que possamos conhece-las melhor. Existe ainda o problema de tradução e adaptação dos conceitos destes sistemas mentais, aos quais muitas vezes fazemos associações grosserias com aquilo que julgamos ser semelhante na nossa cultura. Quantas vezes, por exemplo, sinólogos e indólogos engajados não fizeram aparecer a figura de um Deus próximo do cristianismo nos textos clássicos de Índia e China[28]?

O mesmo ocorre com a questão dos direitos humanos. Não basta somente reconhecer que o oriente e a África possuem outras culturas. É necessário compreender que cada uma delas tem um sistema de vida, para o qual foram criadas perspectivas de igualdade que são diferentes daquelas que nós, ocidentais, criamos para nós. Os direitos humanos são um código válido, portanto, para o Ocidente e para quem mais quiser utiliza-los, mas não podem servir de índice cultural na analise de qualquer sociedade. Se assim o fosse, os próprios criadores e difusores destas propostas estariam entre os que menos a praticam, o que torna este ideal igualitário um grande fracasso ideológico.

A visão levantada pelos autores orientais é muito precisa no que toca a necessidade constante que devemos ter de preservar a cultura, trabalhando, porém, para aperfeiçoa-la de modo humanístico. Neste ponto, a idéia de Humanismo parece possuir uma afeição notável por parte de muitos pensadores de todas as partes do mundo.

Uma análise Transcultural[29] como a proposta por Panikkar ou Multicultural como a de Wang ou de Zhu[30] chamam nossa atenção para o fato de que temos que estabelecer o diálogo para que qualquer proposta de igualdade seja aceita. Em segundo lugar, que este diálogo estabeleça canais de comunicação, mas não regras de trato social com um caráter impositivo. Sem uma certa isenção inicial, e sem a capacidade de compreender que as culturas têm suas próprias formas de administrar o problema da liberdade, todo e qualquer processo de interação será inútil e estéril, o que acaba por promover o uso da força como corretivo. Para finalizar, a atenção dada a estes valores demonstra que dentro de cada sociedade existe mesmo uma diferenciação entre seus extratos, o que embora seja atenuado por questões de língua ou espaço, nos fazem rever a idéia que temos sobre a organização da nossa própria comunidade, sobre o que significam os conceitos de igualdade e convivência, e o que, por fim, explica o nosso espanto diante do aumento de fenômenos como a violência e a pobreza em nosso cotidiano.

Conclusão
Por esta nossa breve análise, podemos concluir que a questão da aplicação dos direitos humanos só pode ser encarada como universal de forma utópica, já que ela diz respeito a uma realidade cultural européia, individualista e liberal. No entanto, os fundamentos desta proposta são realmente universalistas, tendo em vista que o oriente já havia produzido algo semelhante e que a base de elaboração destas propostas esteve sempre centrada no ser humano. Assim sendo, não é impossível que as culturas estabeleçam noções de igualdade e vias de comunicação accessíveis a todos os seres, mas, para tal, existe a condição indispensável e primeira de todas as relações que é o reconhecimento do outro como um legítimo ser humano, indivíduo autônomo (e, no entanto, coletivo), produtor de saber e possuidor de valores tais como fraternidade, amor, respeito, etc a que todos os sistemas éticos e morais recorreram para elaborar suas propostas, tanto no Ocidente como no Oriente.

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[1] PANIKKAR, 1983 P.5-29.

[2] Para saber mais sobre a construção da História Oriental ver SAID, 1996.

[3] Para saber mais sobre esta discussão, ler MALLINOWSKI, 1975; GEERTZ, 1978; LEVI STRAUSS, 1980 e BARTH, 1999.

[4] PANIKKAR, 1983.

[5] Este tipo de posicionamento é que levou autores como LARRE, 1978 a terem que escrever artigos sobre diversos temas filosóficos chineses, já que os Ocidentais tem o costume de lerem o Oriente somente através de suas conceituações.

[6] PANIKKAR, 1983 e 2001.

[7] CHAN, 1978 e 2001.

[8] WATSON, 1969. 1o Cap.

[9] Yi jing, ou Livro das Mutações chinês. Ver WILHELM, 1988.

[10] Chandogya Upanishad. Ver PRABHAVANANDA, 1999 P. 93-96.

[11] Mítico fundador do taoísmo, do século VII-VI a.C. Ver mais em PALMER, 1993 e GRANET, 1997.

[12] Dao De Jing, ou Tratado do Caminho e da Virtude, 42. Ver WILHELM, 2000.

[13] Zhuang zi, também conhecido por Chuang Tse. YUTANG, 2001. Parte 2, Seção 2 e 3.

[14] Mozi, pensador chinês dos séculos VI-V a.C. Ver O livro de Mozi, 2001e também GRANET, 1997.

[15] Sobre Confúcio, ler KAO, 1952; GRANET, 1997; JINGPAN, 1990 e TANG, 1991.

[16] Lunyu, ou Analectos, XV, 23. Utilizo amplamente as citações que seguem em vários de meus trabalhos, por julgar que elas representam de forma clara a profundidade do pensamento deste autor.

[17] Lunyu, XII, 22-23.

[18] Lunyu, XV, 29.

[19] Lunyu, XV, 40.

[20] Ver o trabalho de GONÇALVES, 1995 e GLASENAPP, 1974.

[21] Ver os textos Akaranga Sutra e Kalpa Sutra (CIANO, 2001). Sobre as religiões indianas, ver PUECH, 1993.

[22] É o caso do mito de Purusha (Rig Veda X, 90). Sobre o Hinduismo, ver PUECH,1993.

[23] CHAN, 1978 e 2001.

[24] Ver SHAW, 1978 e 2001.

[25] Ver FAIRBANK, 1996. Sobre as restrições sociais, ver WANG, 1997 e ZHU, 1997.

[26] PANIKKAR, 1983.

[27] CHING, 1978 e 2001.

[28] É o caso das traduções chinesas de LEGGE e de GILLES (século XIX) e indianas de MULLER (XIX).

[29] PANIKKAR, 2001.

[30] WANG, 1997 e ZHU, 1997.



A Questão dos Direitos Humanos numa Perspectiva Oriental in Seminário "História e Violência". Rio de Janeiro: UFRJ, 2001

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