Há uma razão pela qual Mêncio é tão querido e importante entre os confucionistas; ele entendeu Confúcio, e tentou nos explicar o que não conseguimos entender. De seu desejo único em acreditar na bondade humana, Mêncio decidiu lutar para prová-la. Eis a razão pela qual alguns de seus epigramas destinam-se a sustentar nossa fortaleza moral, nos dando ânimo para acreditar na retificação do mundo. Tal como o mestre, seu projeto não é messiânico, nem se destina a reformar a sociedade por meio de milagres ou forças ocultas; apenas eduque-a, e ela seguirá seu curso. É inevitável, porém, não pensar que a grande quantidade de problemas que se interpõem no caminho tornam a tarefa quase religiosa; mas não é o professor um "médico de almas"?
Por esta razão, Mêncio um dia afirmou: "Quando o Céu está por conceder uma grande missão a alguém, ele lhe dá fome, exaure suas forças, faz com que sofra, que surjam dificuldades, e frustra todos os seus planos. Isso ocorre por alguém, para ser grande, tem que ser antes diminuído; para saber o sabor, tem que ter fome; para se fortalecer, tem que ser cansado; para conhecer a felicidade, tem que sofrer; para se superar, tem que ser superado; e para se levantar, tem que estar de joelhos", o que significa: no caminho da realização do que é correto, obviamente surgirão problemas, e devemos nos precaver contra eles. É ingênuo pensar que, ao educar, não encontraremos pessoas deseducadas; na verdade, só pode existir o remédio se existem as doenças e os pacientes. No entanto, caso a educação fosse um projeto frustrado, não estaríamos aqui hoje, e teríamos perecido ante as forças da natureza e a concorrências com as feras e pestes. Disso se conclui, portanto, que a educação é o fundamento da reforma do mundo, e de sua continuidade; e o humanismo, seu sentido final. Não é prazeroso, pois, participar deste projeto?
Mas é claro que as dificuldades cansam. Disse Mêncio, novamente: "gosto de peixe, e também de patas de urso. Se não puder ter ambos, deixo o peixe e fico com as patas de urso. Gosto da vida e do que é correto; se não puder ter ambas, deixo a vida de lado e fico com o que é correto o que significa: e que sentido há em viver uma vida sem sentido? Se deixar governar pelos acidentes da vida é abandonar-se a si mesmo, e abrir mao justamente de sua humanidade. Algumas pessoas preferem viver em companhia dos animais, deixando de lado a civilização; belos covardes! Rebaixam-se ao nível das feras selvagens, e se dizem sábios! Mas ao terem uma doença, procuram os médicos; quando tem fome, comem cozido; mesmo em seus esconderijos, usam roupas e tem pudores. Enfim, sua vida é egoísta, no pior sentido do termo, posto que vivem da humanidade, mas em nada querem contribuir para ela. Por esta razão que estas coisas não conseguem durar muito. Confúcio já dizia: "se você conhece um eremita, é porque ele não é mais um eremita"; do mesmo modo, uma vida sem um sentido perde seu sentido, e o próprio humano sente isso. O sábio aprende, ao longo desta curta existência, que é necessário acreditar em algo - que seja, de preferência, algo apropriado.
Pois o atributo que distingue os humanos dos animais é o pensamento, e a inconformação com suas fraquezas naturais. Por qual razão, então, abandonar as conquistas da cultura em função de um discurso pessimista, que defende a fatuidade de viver? Novamente, disse Mêncio: "a função da mente é pensar, e o conhecimento da verdade depende de exercitar este pensar. Estabeleça primeiro os princípios do que é importante, e os detalhes irão surgir", o que significa: dando sentido a vida, estabelecendo o propósito de educar a si mesmo e ao restante do mundo, o mundo irá fluir num mesmo ritmo, e tudo seguirá seu curso natural, com nossa ajuda.
Por isso, Mêncio nos ensina que ser sábio nunca foi fácil, mas que apenas um é capaz de muito mais do que todos aqueles que nunca buscaram a sabedoria. Se as palavras do sábio ecoam no mundo, porém, é porque os bons corações estão preservados, e somente uma sociedade dirigida por gente da pior espécie pode degenerar. Ainda assim, porém, as pessoas se revoltam com a maldade e buscam o bem. A felicidade de um sábio, pois, é assistir estas mudanças, e dar sua contribuição para elas.
Um bom maestro só dá o exemplo, e faz com que a orquestra o acompanhe. Deve ser esta a razão da devoção de Confúcio e Mêncio à Música.
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