As idéias dos antigos são eternas novidades, pois sua profundidade é somente captada por aqueles que os estudam e compreendem. A sabedoria está nos princípios, e suas manifestações se dão na mutação. Por esta razão, as vozes distantes dos sábios antigos são retomadas, de tempos em tempos, para elucidar as mentes humanas. Percebê-las é anotar, portanto, a hemeroteca de suas ponderadas observações sobre o mundo, a humanidade e as coisas. Nas frases que se consagraram sondamos, então, o cerne de seus pensamentos; e nesta coletânea, nos dedicaremos ao sábios ocultos, os grandes mestres ancestrais cujo anonimato não lhe salvou os nomes, mas cuja sabedoria eles concederam sem aguardar posteridade. Foram tão somente pessoas, mas quem não desejaria sua iluminada sabedoria?
1. Mais leis, mais crimes
Um bom governante deve dar o exemplo moral. Sua firmeza, sua determinação em fazer o que é apropriado, e sua obstinação em realizar o que é justo costumam inspirar as pessoas a seguí-lo. Ocorre, contudo, que entre sociedades em que as pessoas são pouco educadas, e menos ainda sabem sobre a sabedoria, um governante pode ser mal compreendido, passando por temeroso se defende intransigente os seus princípios, ou por fraco, se administra a vida do povo com liberdade. Em ambos os casos, vale sempre tentar educar e corrigir, deixando a punição por último. A questão é que entre as mesmas gentes ignorantes, muitas vezes se crê que o uso da força é a solução imediata e satisfatória para os problemas - e este é outro terrível engano. Quanto mais leis existirem, mais crimes serão criados, e mais criminosos existirão. Regimes duros só são bons, inclusive, enquanto se está do lado dos que mandam, sujeitos a seus caprichos e vontades volúveis - não raro, quando os mandatários mudam de opinião, e a intriga reina, a violência irrompe e ninguém fica a salvo. Por isso, um sábio exista em legislar, e pondera sobre a melhor maneira de resolver as coisas, dentro da lei, mas sem excessos. Como disse Confúcio, "em resolver pendegas, sou bom como qualquer outro, mas o melhor é que elas não existam".
2. Quem dorme com o cão, acorda com as pulgas
Confúcio já dizia; observe as amizades de uma pessoa, e disso se extrairá muito sobre sua personalidade. As pessoas unem-se por interesses comuns, por valores similares ou mesmo por idéias consonantes. Assim sendo, não existem casos em que as amizades são acidentais: as pessoas se fazem acompanhar daquilo que elas são e desejam para si próprias. É um erro ser indulgente com aqueles que, estando em companhias inapropriadas, julgamos que possam estar iludidos acerca do que fazem - são raros os casos em que, de fato, alguém se ilude por completo com as suas companhias. Por outro lado, duas coisas devem ser ponderadas: primeiro, que não devemos fazer julgamentos apressados sobre as pessoas - afinal, é mais certo que elas saibam o meio em que estão inseridas do que aqueles que vêem a situação apenas de maneira superficial ou pouco esclarecida. Para emitir uma opinião sobre quem quer que seja, devemos investigar, analisar e raciocinar, evitando assim a injustiça. Em segundo lugar, pode ocorrer que alguém deseje mudar sua vida, iniciando o caminho da sabedoria. Seus antigos companheiros, porém, preferem continuar atolados na ignorância. Nestes momentos, os buscadores começam a ser tomados por dúvidas sobre o que estão fazendo, e se se afastar dos antigos colegas é o certo. Ora, a opção pela descoberta da sabedoria envolve, muitas vezes, desvencilhar-se daqueles que preferem continuar em seus mundos limitados de desconhecimento. Apesar de dura e difícil, a tarefa é recompensadora, no entanto. Aqueles que se afastam de um buscador da sabedoria nunca foram seus amigos de fato, mas prefeririam vê-lo a continuar na mesma indigência intelectual e espiritual dos tolos. Quem, porventura, decide por abandonar o caminho e retornar a situação anterior, que se lembre - acordará junto de todos os problemas que tinha antes, e se verá envolvido por todos os inconveninetes causados pela ignorância.
3. Cão velho não aprende truque novo
Alguns se orgulham de dizer: "o que eu sei é isso, é o que eu aprendi e pronto" - ao que Confúcio, um dia, comentou: "somente o sábio o estúpido não mudam". O sábio está sempre disposto a aprender, e isso não muda nele; mas o ignorante insiste sempre em suas tolices, acredita que já sabe o suficiente e sempre se incomoda em tomar lições de um mestre. Seus atrevimentos não tem limites, e são correspondentes a sua idiotice. Contudo, o Céu é sempre generoso, e dá a oportunidade das pessoas mudarem, contanto que queiram fazê-lo para si mesmas. Assim, um ignorante pode, um dia, vir a ser sábio. Mas para isso, ele precisa se dispor a aprender, e com humildade. Quem, no entanto, acha que entende das coisas... não aprenderá nada de novo, nunca.
4. É para dentro que dobra o cotovelo
Todos os seres humanos tem suas propensões naturais, que manifestam em vários níveis diferentes no cotidiano; ao agirem em sociedade, tendem a privilegiar suas famílias; no trabalho, favorecer os colegas; na amizade, priorizar os mais leais; e no amor, as que mais lhe tocam o coração. Tudo isso é válido, contato que não se esqueça; que o que é correto e apropriado está acima da família; que no trabalho, o mais competente é o melhor; que na amizade, a lealdade e a fidelidade exigem que não se concorde com propósitos errados, e que se intervenha se um amigo vai fazer besteira; e por fim, que no amor, mais do que o sexo, exista também a familiaridade, a amizade, a lealdade, a fidelidade, a dedicação e a comunhão de propósitos. Havendo isso, a tendência natural das coisas é uma só, e flui na única direção possível e ao mesmo tempo, desejável.
5. Paz no Céu, Paz na Terra; Paz no Homem, Paz no mundo
A natureza não cria calamidades e sofrimentos de modo aleatório, ou com interesses vis; a natureza tem apenas a sua própria ordem, e com ela devemos estar em harmonia. o Céu e a Terra se completam mutuamente, e por isso as coisas florecem e a vida se cria. Cabe ao ser humano, porém, criar os conflitos e desasossegos que o perseguem. Muito ele reclama de um destino que não lhe é favorável, mas isso é bobagem; é a própria sociedade, a vida humana, os relacionamentos entre as gentes, e a prática incongruente e contraditória de seus valores sociais que provoca e gera tantos conflitos. Havendo paz dentro do próprio ser humano, há paz no restante do mundo - e aí, Céu e Terra podem ser compreendidos em suas plenitudes.
6. Não se toca música para as vacas
O refinamento é destinado as pessoas que podem apreciar as coisas delicadas e sensíveis. Todos podem refinar-se, mas não se pode exigir que os mais inclutos compreendam, de imediato, certas coisas com as quais não tiveram ainda contato. O paladar é um exemplo clássico disso: quem se acostumou com comidas pesadas e grosseiras dificilmente percebe as sutilezas de sabores mais delicados. Assim é, também, o exercício da sabedoria; pessoas estúpidas tem dificuldades tremendas para apreender os detalhes das coisas, ou o seu sentido real. Elas separam o que está junto, e amontoam o que deve ser separado. Para atingir os mais rudes, deve-se proceder com cautela, chegar-se até eles com os meios que lhes são comuns, e empregar o intelecto para compreender suas dificuldades e barreiras. não se deve perder tempo investindo em discursos belos, mas incompreensíveis, em ciências complexas ou em gostos exóticos. Seria desperdício, e em alguns casos, até mesmo uma ofensa. A cada um, o que se pode dar.
7. A árvore depende da raiz; e o homem, do seu coração
Raiz forte, árvore forte; raiz fraca, árvore arrancada. Do mesmo modo, é o ser humano; construa-se sábio, e a tudo superará; deixe-se tolo, e com tudo sofrerá. Um árvore, para ser forte, precisa de sol, chuva e muito estrume; um coração, para ser forte, também precisa das mesmas coisas; luz da sabedoria, alimento da leitura e as merdas das experiências da vida - que contém, porém, muito do que nutre e fortalece o caráter. Depois, frutifica.
8. Pode-se enganar os superiores, mas não os inferiores
Podemos iludir as pessoas com elogios, afagos e bajulações - e no caso dos superiores, isso é tão mais fácil quanto é a ignorância dos que comandam. Os inferiores, contudo, sabem o que querem, e atuam exatamente por isso. O raciocínio é simlpes: ao se tentar passar a perna nos que estão acima, sabe-se o que se quer conseguir. Por isso os superiores podem ter dificuldades em identificar o que está se passando - esta é a essência da intriga. Mas que o inferior de hoje lembre-se que, amanhã, será vítima das mesmas coisas. Por esta razão que o sábio tenta promover a sabedoria, e tornar todos iguais a ele próprio, ou mesmo superá-lo - assim, não há discordância nos propósitos, e a hierarquia é a da sabedoria.
9. A água afoga mais os bons nadadores do que os maus
Confúcio dizia: sábio é aquele que sabe o que não sabe, enquanto o tolo não sabe o que não sabe. não raro, pois, ele toma o que sabe por tudo, e se expõe ao perigo; mas o sábio age com cautela, e sua coragem, tanto quanto suas atitudes, não se apegam a tolice.
10. Viver como pobre é fácil, difícil é fingir ser rico
Quanto mais simples se é, mais fácil viver segundo suas próprias vontades e conveniências. A pobreza não presta contas, senão a si mesma; e quanto mais sábio alguém é, menos se apega as coisas, e aproveita da simplicidade para despreocupar-se do que é irrelevante. A riqueza, porém, implica o cumprimento dos códigos sociais, da aparência, da disputa estética, e das possíveis implicâncias morais que isso tem. Laozi disse sabiamente: acumula tesouros, e chamará os ladrões. Quem nada tem, pois, tem bons amigos. Difícil é o fardo, portanto, de quem escolhe a opulência como meio de disfarçar a pobreza do coração.
11. Há três coisas que não voltam: a flecha disparada, a palavra dita e a oportunidade perdida
Do que se depreende o seguinte: pondere antes de agir, planeje antes de executar, e aja de modo a correponder a seus princípios. Disse Confúcio: o cavalheiro é lento ao falar, mas é pronto no agir; e faz com que seus atos sejam identicos as suas palavras.
12. Quem fala mal dos outros na nossa frente, fala mal da gente na frente dos outros
Existem pessoas que acreditam que a maledicência pode ajudar na amizade. Assim, elas trocam segredos, mexericos e intrigas acerca de alguém, com o intuito de reforçar uma suposta confiança com seu interlocutor. Devemos apenas lembrar que este procedimento pode repetir-se indefinivelmente, e que isso revela o caráter do malediscente - como se poderia confiar nele? Mas em sua ingenuidade tola, as pessoas costumam a acreditar que são digna de confiança porque ouviram fofocas alheias... acaso não é o mesmo que se dará com aquele que busca conquistar a simpatia dos outros? Quem busca a sabedoria se dá o direito de criticar sim, mas com fundamentos; e defende seus pontos de vista abertamente, sem buscar compromissos. não há amizade real nisso, e somente os tolos jogam com este proceder equivocado.
13. Água clara não tem peixe; homem claros não tem sabedoria
Um sábio é sempre misterioso para os ignorantes, e isso se dá por uma razão; eles não o compreendem, por causa de suas próprias limitações. O farsante, porém, mesmo que se revele por inteiro, ou se faça parecer transparente em suas intenções, logo revela a dimensão do seu caráter, e não engana mais ninguém, senão somente os incautos. Deve-se desconfiar, portanto, de quem é claro demais, de quem se apresenta de modo muito distinto, e de quem se arroga ser franco; estes ocultam interesses particulares, que logo aparecem - afinal, não se pode disfarçar as coisas quando a capa que as cobre não contém nada de relevante. O sábio, no entanto, nada tem a esconder; e por isso mesmo, as pessoas comuns costumam vê-lo como as águas turvas, em que se escondemos peixes, sem compreender de imeditao a sua profundidade. Quando necessário, o sábio torno o óbvio acessível para todos, mas mesmo assim, muito preferem não enxergar.
14. O filho não vê a feiúra da mãe
O que significa: desprovidos de preconceitos, e movidos por sentimentos autênticos, vemos a verdadeira personalidade das pessoas. Liu Shao estudou todos os caracteres das faces humanas para concluir o que esta frase diz: que os sinais do verdadeira humanidade não se encontram na tipologia morfológica da beleza externa, mas na pureza do coração. Quando alguém é capaz de preservar este modo de olhar as coisas, que se inicia com o amor pelos pais, e pode estender isso ao restante do mundo, começa o caminho da sabedoria antes mesmo de ler os clássicos ou ter as primeiras lições na escola.
15. Sabedoria não depende da idade - quem fala é a boca, não os cabelos
Muitos velhos se arrogam sábios porque já viveram demais, mas o que fazem é apenas repetir sua pouca inteligência e experiência ao longo dos anos; do mesmo modo, muitos jovens acham que entendem de tudo, e que suas poucas vivências já são o bastante. Ambos se equivocam. Quanto mais anos vivemos, mais coisas podemos aprender sim, contanto que a postura seja aquela que busca verdadeiramente o conhecimento. Esta deve ser desenvolvida desde a infância e juventude, mas se consolida com os eventos que, inevitavelmente, ocorrem nas fases maduras da vida. Assim sendo, embora a idade favoreça um vasto leque de oportunidades para adquirir a sabedoria, ela não será nada sem a leitura correta. Do mesmo modo, a juventude bem orientada por amadurecer mais rápido, e de maneira mais saudável, quando aprende cedo sobre o caminho. Cabelos brancos são sinais do tempo; mas a sabedoria não está para além do tempo?
16. Aprender é como remar contra a corrente; se não avança, recua
No processo do aprendizado, quem se abandona, se perde. Pessoas com potencial e cujas propensões são favoráveis, ainda assim, se tomadas pela preguiça, inércia, indolência ou auto - indulgência, irão se desperdiçar, e não chegarão a lugar algum.
17. Só se nasce de um jeito, mas se morre de cem modos diferentes
Existem vários caminhos para se chegar a sabedoria - e embora façamos opções, pode-se afirmar que eles servem, de um modo ou de outro, para elucidar e estimular a busca das pessoas por um sentido. não se pode mudar um início, mas sempre se pode criar um novo fim - sendo assim, não deveria haver razão para as pessoas não buscarem ser sábias, porém... a ignorância é a opção mais fácil e difícil de todas, e muitos insistem em dedicar-se a ela. Escolher o modo de morrer é um reflexo de como alguém se propôs viver, e nisso consiste a nobreza de um caráter - o junzi confucionista.
18. Se uma palavra não basta, mil se perdem
Sempre que possível, e quando um sábio julga que é necessário, ele se propõe a explicar para as pessoas aquilo que elas ainda não sabem ou não compreendem. Se alguém busca instruir, deve fazer com que suas lições sejam adequadas ao público, que sejam acessíveis, e que a linguagem empregada atinja os ouvintes. Mas há limites: só se pode ensinar para quem quer aprender. Quando se percebe que os alunos escutam mas não ouvem, percebem mas não pensam, falam mas não respondem, melhor então não desperdiçar palavras. Só se deve explicar para aqueles que desejam aprender de fato; caso contrário, apenas desperdiçaremos palavras.
19. Sem vento contra, uma pipa não sobe
Quem deseja aprender sem esforço corre atrás de uma miragem; em todas coisas na vida, pode-se compreender algo com maior ou menos facilidade, segundo nossas propensões, mas só chegamos a compreendê-las se realmente elas se apresentarem como desafios intelectuais aos nossos conhecimentos. Na matemática, aprendemos com os problemas; um livro só pode ser apreciado depois de lido; um mistério só é desvendado depois de estudado. Todas as coisas na vida, pois, dependem do esforço e do estudo apurado e profundo; as supostas dificuldades que se interpõem são, na verdade, o futuro conhecimento adquirido. Quem enxerga as adversidades como problemas ao conhecimento age de maneira equivocada; a única barreira ao verdadeiro conhecimento é, somente, aquela gerada pelas limitações do próprio ser humano, e de suas atitudes derivadas do desconhecimento.
20. Melhor ser muito desconfiado do que muito crente
A dúvida é o princípio do conhecimento; quem se dedica a acreditar, sem muito raciocinar, expõe-se ao domínio do acaso, e submete sua vida ao desejo dos inventores de crenças. Todo o ignorante é um escravo de sua própria limitação; acredita no que lhe convém, e desconfia do que pode libertá-lo. A dúvida, portanto, faz parte do raciocínio edificante.
21. Pobres não tem talentos; fracos não tem aspirações
Na pobreza, aspira-se mudar de vida, mas às vezes faltam os meios para isso, tal como a educação necessária. Um pobre pode mudar sua vida, portanto, por meio do aprendizado que lhe permite alcaçar suas aspirações. O fraco, porém, pode ter talentos, mas não aspira nada, nem deseja chegar a lugar algum. Ele se encosta na humanidade, parasita os favores dos mais próximos, e sobrevive pessimista ao seu destino, sempre dependente da existência - e ele o sabe - de outros que o sustentem. Um pobre sem talento pode um dia se tornar um sábio; mas um fraco, seja pobre ou rico, talentoso ou não, só poderá modificar-se com uma transformação profunda de si mesmo.
22. Encha a cabeça, e será feliz; encha o bolso, e será roubado
A riqueza é um meio de dar dinamismo ao mundo da mutação, e por isso não deve ficar parada. Quem apenas almeja enriquecer-se, nunca terá o suficiente, e sempre se preocupará com mais. Quem apenas gosta de seu trabalho, e o faz por prazer, muitas vezes acumula riquezas imensas, mas pouca importância dá para isso. Uam cabeça cheia de idéias move o mundo; mas um bolso cheio só desperta a cobiça, e atrai apenas os interesseiros.
23. Quem não gosta de ler, não sabe ler
Escolha ser ignorante e o será - este é a única coisa da qual alguém poderia se vangloriar, dizendo que decidiu pr conta própria ser o que é. Mas o que escolheu!!! O analfabetismo opcional é o arremate da ignorância redundante e da tolice engajada.
24. Noite sem lua e sem estrelas
Isso significa: mente em trevas absolutas, onde não há presença da luz e do conhecimento. Diz-se isso acerca do ignorante que prefere ficar na escuridão de si mesmo, e que se aliena da realidade em função de futilidades e de um vida superficial.
25. Haste de trigo, cheia de grão, abaixa a cabeça
Quando aprendemos com o caminho da sabedoria, reconhecemos a força e o conhecimento das observações penetrantes feitas pelos sábios. Baixamos a cabeça em respeito, assim como nos empolgamos comsuas boas idéias. O trigo jovem, porém, é duro, reto, seco - ele não tem conteúdo, mas permanece firme, de modo arrogante, enfrentando tudo, mas sem ter nada dentro de si. Por esta razão, aqueles que sabem, aprendem a vergar-se ao conhecimento, a adaptar-se ao contexto, e estar em harmonia com as coisas. Flexíveis, eles sobrevivem a ventania, enquanto o as hastes retesadas são arrancadas.
26. Quando um canta, todos seguem
A música é o meio mais perfeito de expressão de idéias. Ela combina a sabedoria das reflexões, com a expressão sintética da arte da poesia, e acompanhadas pelo veículo penetrante dos sons e melodias. Um bom sábio se faz acompanhar de suas idéias como um bom cantor puxa seu público, e lhes desperta sentimentos entoando canções que tocam o inítmo. É difícil alcançar este nível de envolvimento entre as pessoas e o sábio, de modo que estas o sigam. Mas é tão raro ser sábio, de fato, como ser bom músico - e obter um consenso é tarefa notável...
27. Quando a viga mais alta está empenada, o resto está torto
Se aquele que comanda não dá o exemplo, e ele mesmo é corrupto ou fraco, o restante se contaminará disso, e nada mais funcionará. Os bons serão perseguidos e punidos por sua competência, os habilidosos serão diminuídos em tarefas ridículas ou menos importantes, e aos poucos o sistema se degradará. Estas são épocas de crise, causadas pela ignorância e pelo desleixo, que prejudicam toda a estrutura das coisas. Um sábio deve tomar cuidado com estas ocasiões, e preparar-se para ir embora, se necessário for, quando compreender que nada pode fazer para entortar a viga principal.
28. Para cortar uma árvore bem rápido, gaste o dobro do tempo afiando o machado
Sunzi disse: nas campanhas, a preparação e a antecipação são os momentos fundamentais. As batalhas são apenas consequências disso, e não o objetivo final. Do mesmo modo, o sábio se prepara a vida toda para o momento em que ele for necessário. A eficácia consiste em poder responder exatamente ao que se coloca, sem perda de tempo, e da melhor maneira possível, de modo a beneficiar o mundo.
29. Até mesmo o boi tem que aturar as moscas
Quando seguimos o caminho da sabedoria, e nos decidimos por exercer nossas funções como servidores do mundo, é inevitável que dos defrontemos com os interesses corruptos dos ignorantes. A incompreensão de grande parte das pessoas às propostas corretas, unidas à intriga e a maledicência, começam por atormentar a vida do sábio. Isso não impede que suas propostas vinguem, nem que ele obtenha sucesso; contudo, ele deve precaver-se que será criticado, e atrairá para si inveja e ciúme. Nem mesmo o boi, com sua força descomunal e sua presença inigualável, consegue afastar as moscas de si. Por outro lado, elas não impedem de fazer o seu trabalho, tal como o sábio não se demove de seus propósitos pelo bem da humanidade.
30. Mentiras bem contadas viram verdades
Para os que não possuem senso crítico algum, a aceitação de uma versão qualquer da história ou dos acontecimentos se dá pura e simplesmente pela empatia que esta desperta em sua pessoa. A compreensão dos eventos e da manifestação das coisas, de maneira fundamentada, interessa ao pesquisador sério, ao sábio, e para aqueles que foram despertados pelo incômodo da descoberta. No entanto, o ignorante se satisfaz com mentiras e crenças infundadas, contanto que estas o agradem e o divirtam ou consolem. Quanto mais elas perduram no tempo, mais se assentam, criando verdadeiros miasmas ao conhecimento sério e profundo das coisas.
31. Mãos trabalhando desocupam a língua
Diz-se daquele que, por mais humilde que seja em sua profissão, se ele ocupa seu corpo e sua mente com uma tarefa edificante, ou na qual simplesmente goste e se envolve, dentro dos modos apropriados, ele não encontra nem tempo e nem motivos para praticar a maledicência. Suas palavras podem escassear, mas adquirem uma força de verdade inigualável.
32. A verdade pode não ser agradável, mas ser agradável pode não ser verdadeiro
A diferença entre a sinceridade e a indelicadeza é a seguinte: o sincero diz "não gosto", e o indelicado diz "está péssimo". Quando perguntado sobre suas predileções, o sincero pode explicar que não gostou de algo por um certo número de razões; o indelicado, ao pular etapas, expressa seu pensamento de modo ligeiramente arrogante, criando uma tensão desnecessária. Ambos, porém, buscamao seu modo transmitir a idéia de verdade da qual compartilham, e desejam de alguma forma o melhor para seu interlocutor. Os bajuladores enxergam esta situação de modo contrário, visando tirar proveito pessoal dela. Por conta disso, deixam a verdade de lado, e buscam os expedientes precisos para mascarar suas intenções. Uma pessoa desagradável, porém verdadeira, sempre é preferível a um falso enganador - exceto, claro, para os que se comprazem em serem enganados.
33. Correr atrás do rabo do macaco
O macaco é um dos animais mais espertos, ágeis, rápidos e brincalhões da natureza, integrando o imaginário chinês como um animal mítico. Quando fazem suas artimanhas, é difícil capturar qualquer um deles. Os tolos sempre empregam de métodos violentos para supreender os macacos, tentando alcança-los e puni-los. não raramente estes métodos falham, pois os macacos, velozes e espertos, enganam facilmente os humanos e outros animais de caça, tal como os caẽs. Um caçador inteligente, ou mesmo um sábio, atraem os macacos para armadilhas bem planejadas, que buscam seduzi-los com o que mais gostam - frutas ou guloseimas - pois sabem que correr atrás de um macaco é algo praticamente inútil. Assim, somente um idiota corre atrás do rabo do macaco, enquanto os inteligentes sabem atrai-lo - do mesmo modo, o parvo persegue coisas inalcançáveis, enquanto o sábio as atrai para si.
34. O Perdão vem do coração
O ideograma perdoar é composto pelos signos "ato, movimento" e "coração", ou seja, o ato de perdoar alguém surge de dentro do coração. O sinal "ato" possui ainda um significado especial, que é a conjugação dos sinais "mulher" e "boca", ou, que a ação motivadora de perdoar vem das palavras e do coração cuja sensibilidade feminina predomina (tal como o famoso coração de mãe). O verdadeiro e sincero perdão vêm do coração; mas oq ue é perdoar? O perdão envolve o esquecimento? Erros causados por imaturidade podem e devem ser esquecidos; contudo, atos que prejudicam a alguém, e que foram deliberadamente planejados, merecem atenção: quem os fez, pode invocar o perdão, sem no entanto estar realmente arrependido; quem os comete, também, pode até arrepender-se, mas voltar a repeti-los. Por estas razões, um sábio muitas vezes releva, mas não pode perdoar inteiramente, pois isso seria um ato de ignorância irreposnsável. O perdão verdadeiro depende do amor a humanidade, mas este mesmo humanismo - o Ren - não é cego nem imbecil.
35. Grandes coisas vem das coisas pequenas
Todos os grandes sábios nasceram de uma mãe e um pai, comeram, dormiram, amaram, respiraram, estudaram, lutaram, acreditaram e morreram. Para serem grandes, fizeram o que todos fazem; disso se concluiu que qualquer um pode ser um grande sábio, pois o trajeto é o mesmo. cabe ao que busca fazer a diferença de sua própria vida. Da mesma maneira, é fundamental, portanto, que todas as pessoas tenham condições de poderem aflorar suas potencialidades, razão pela qual Confúcio insistiu tanto no projeto educativo chinês. Todos podem ser sábios.
36. Das 36 estratégias, sair correndo é a melhor
Acontecem ocasiões em que alguém pode ser exposto a uma situação de violência, como uma briga ou um roubo. Exceto nos caso em que se torna necessário defender um parente, amigo ou familiar, a melhor estratégia é, simplesmente, fugir. Ela evita um conflito desnecessário, bem como danos corporais sem sentido. Valores como honra ou coragem podem não ser cabíveis em situações de perigo - como no caso de enfrentar vários oponentes, ou mesmo se os adversários são desconhecidos - e fugir não implica nenhum demérito, mas simplesmente, preservar-se a si mesmo. Situações que envolvem a luta motivada por honra, defesa de entes próximos ou sobrevivência são de outra alçada, e nem se prestam a reflexão: são simplesmente necessárias, e inevitavelmente amargas.
37. A paciência é a sabedoria da espera
A paciência é uma virtude sublime, resultante de uma tremenda força de caráter. Ela consiste na capacidade de resistir a pressa, ao tumulto, ao desespero e ao atropelo das emoções. O sábio é paciente com o processo natural de transformação das coisas, e ele acompanha e obsevra este desenrolar. A paciência, contudo, não é uma espera tola, de algo que pode não ocorrer. Um sábio não tem esperanças - a esperança só existe para aqueles que desejam mudanças sem fazer força para empreendê-las. O sábio faz planos, e aguarda seu desenvolvimento - assim como na natureza, as estações passam, e nada pode ser feito para apressá-las.
38. O suor é amigo das boas idéias
Para se inspirar, é necessário transpirar. Boas idéias e reflexões acertadas vem dos problemas que se apresentam. Quando meditamos, nossos pensamentos se dirigem ao que é mais importante, se nos defrontamos com coisas reais. No entanto, no momento em que nossas especulações se perdem em bobagens ou coisas superficiais, nos aflingimos com o que é mutável, e literalmente perdemos o tempo.
39. Todo o problema traz consigo a solução
Todo o universo é yin e yang. Isso significa que, ao nos deparamos com um problema, devemos examinar suas raízes e tendências, para assim encontrar uma solução de ajuste. Todos os problemas tem uma solução possível, que está em sua contraposição ou oposição complementar. Na vida humana, o mesmo se dá quando sofremos decepções com os amigos, colegas ou parentes; de certo modo, eles nos levam a pensar o que possivelmente fizemos de errado para merecer tais infortúnios. No entanto, se fomos simplesmente traídos, ou se não há culpa em nossos atos, então, o afastamento dessas pessoas deve ser entendido de forma positiva, e o que era um problema, se transforma em solução. Nada pior, afinal, do que conviver com os adversários tão próximos de nós, e seu afastamento é um favor.
40. Leis não servem para os puros, nem se aplicam aos corruptos
Aqueles que dominam a moralidade não são alvo da lei, pura e simplesmente por se conduzirem sempre de modo apropriado, e se colocarem diante de todos de maneira justa. Quanto ao corrupto, este já burlou as leis, as desafiou e prejudicou a todos. No caso dele, não se trata mais de aplicar as leis, e sim, as punições.
41. Que a tartaruga do mar abençoe suas dez mil gerações
A tartaruga do mar é um animal longevo e experiente, a verdadeita historiadora da natureza. Ela acompanha as mudanças do tempo e das coisas, e sua presença é auspiciosa. A visita da tartaruga do mar é uma grande honra, e sua presença, bem como suas bençãos, espalham-se por gerações e gerações de uma família, garantindo-lhe a continuidade.
42. Não comece; se começar, não desista
Todo o empreendimento possui riscos, que devem ser calculados ao máximo. Com bom planos, pode se executar quase tudo; e com obstinação, as chances de sucesso serão sempre maiores. Por isso, os que são fracos de espírito não devem arriscar coisas de última hora, bem como não devem tentar nada se não imaginam poder continuar. Ranqiu, discípulo de Confúcio, reclamava que não conseguiria ir além, mesmo sabendo que a doutrina dos letrados era boa. O Mestre lhe respondeu: "e não vai mesmo! você já traçou seus limites, não vai passar deles". Depois, Ranqiu se tornou um corrupto. O que isso significa? Que Ranqiu era um previdente? Não. Ranqiu era auto indulgente, e esperava ser recompensado por sua falsa modéstia. Ele nunca teve planos de ir adiante, nem de se superar. Os fracos de espírito são assim: ou não empreendem nada, e vivem se lamuriando, dizem que não são capazes, ou quando se convencem que podem, arriscam tudo de última hora, sem ter um plano. Ao fracassarem, justificam a primeira atitude com base na segunda; mas se tiverem sorte, dificilmente levam os planos adiante, pois não sabem o que fazer. Tudo consiste, pois, em fazer planos. Eles são falíveis, e sujeitos a erro - no entanto, quando algo não se concretiza, temos a consciência tranquila de ter empreendido dentro das possibilidades e recursos de que dispunhamos. Portanto, se não temos certeza de que algo pode funcionar, melhor não tentar; mas se começarmos, devemos buscar levá-lo a cabo.
43. Abandonar pela metade é fracassar por completo
Ao iniciarmos algo, e se fizemos planos, devemos buscar concretizá-los. Muitas vezes, pensamos em desistir no meio, acreditando que as coisas não se desenrolam como gostaríamos. Ora, problemas inesperados surgem em qualquer empreendimento, e muitas vezes podem até mesmo aprimorá-lo; no entanto, salvo os casos em que o andamento de um plano pode prejudicar mais do que beneficiar - o que significa que o plano já estiva errado desde o início - não devemos nunca parar as coisas pela metade. Ao pararmos um processo no meio, supomos que já fizemos o suficiente, e que metade se estebeleceu, mas isso é equivocado; o que ocorre é que já despendemos recursos de monta para empreender algo, e eles dificlmente serão reaproveitados. Por fim, o objetivo último não se concretiza; então, o que se conseguiu fazendo tal coisa? Pela metade é como uma perda total; e quem se contenta com pouco tem o nada como razoável para si.
44. Ser pobre e não se queixar é mais difícil do que ser rico e não ser arrogante
Dificilmente quem têm entende quem não têm. A pobreza humilde, sem queixumes, resulta ou de uma submissão total de caráter ou de uma fortaleza íntima inigualável. Neste último caso, uma pessoa pobre, que tenha tal força interior, pode vir a ser um grande sábio ou líder. Em meio as privações, ela compreende o poder da simplicidade. Quanto aos ricos, porém, as perdas mínimas costumam incomodar, e lhes é difícil compreender o comportamento das pessoas que vivem em privação. Somente aqueles que obtiveram suas riquezas, por meio de trabalho duro, conseguem agir sem invocar titulações ou poderes especiais. Estes, que compreendem a organização do trabalho na sociedade, e que compartilham das experiências dos humildes, podem ser grandes líderes, e movem o mundo por meio de suas atitudes e empreendimentos. Mas como são raros!
45. A lealdade é inimiga da oportunidade
Amigos leais se apoiam em qulquer circunstância, por mais difícil que seja. Um amigo verdadeiramente leal só não apóia o outro se este estiver errado; ainda assim, ele aconselha, tenta corrigir, e se vê que nada pode fazer, se retira. Já os falsos amigos vêem as oportunidades, e nos momentos de decisão, se agarram ao ganho e abandonam a lealdade. O problema deste comportamento é que ficará patente, a todos que o cercam, que sua leviandade é perigosa - e dificilmente o oportunista conseguirá novos bons amigos, perdendo de vez a confiança alheia.
46. Há sábios sem instrução; Há instruídos sem sabedoria
Existem pessoas que, ao longo da vida, adquirem a sabedoria por meio do execício dos bons valores, e da conquista da simplicidade íntima. Sem desejar muito, conseguem tudo; sem fazer força, são queridos e desejados em todas as festas e encontros. Em compensação, existem acadêmicos que estudam apenas para aprimorar suas estratégias de conquista, de ganho pessoal, deixando de lado o humanismo presente em todas as ciências, para exercitar seus comportamentos indecentes e inapropriados. Títulos não trazem sabedoria; somente a busca sincera a traz.
47. Não se contempla o Céu do fundo do poço
O ignorante entende o mundo por meio de suas limitadas visões culturais. Ele concebe que todos agem de modo similar ao dele, que os hábitos comuns são os mesmos que os seus, e que suas opiniões e juízos são acertados simplesmente porque o são. Ele tripudia dos estrangeiros, chamando-os de ignorantes, e não vê importância naquilo que não contribui em sua mediocridade. Do fundo de seu poço, ele não consegue apreender a vastidão do universo, e as miríades das coisas existentes. É uma vida lastimável.
48. O dez tem o nove e o oito
Oito e nove são dois números auspiciosos. Esta frase nos informa que as pessoas tem potenciais ou recursos para desenvolver-se, mas que o ideal é ter tudo a mão para realizar seus planos: dominar o externo e o interno, ter os meios e ter a si mesmo.
49. A verdade geralmente se disfarça de piada
Um dos meios mais criativos para denunciar os erros e comportamentos inapropriados é o bom humor. O sábio, mesmo sendo sério, costuma ser um gozador irônico e sarcástico, e procura muitas vezes apresentar a verdade de modo divertido e suave. Gozar de alguém, diante de todos, e com a razão ao seu lado, é um dos momentos mais difíceis da sabedoria; ela exige que a verdade não seja banalizada, que o comportamento inadequado seja denunciado, e que o sábio se prepare para uma resposta violenta, já que o criminoso pode tanto envergonhar-se quanto irritar-se. As piadas são meios válidos para estimular a reflexão, mas devem ser utilizadas com tanto cuidado quanto a sinceridade pura e simples.
50. Quem planta a árvore não aproveita a sombra
Os sábios fazem as coisas para o mundo. Seus empreendimentos podem não ser valorizados agora, mas somente nas gerações posteriores. Mesmo Confúcio não foi devidamente compreendido e apreciado em sua época, mas não é por isso que se deve abandonar o caminho da sabedoria. Diante do universo, o tempo de nossa existência é mais breve do que um suspiro - e o sábio faz o que tem que fazer simplesmente porque é o apropriado, e as benesses disso de desdobram no futuro. Por estas razões, o caminho deve ser cultivado, e seu fim último é tão somente o seu estudo.
51. Um buda de barro não se ajuda a cruzar o rio
O Céu auxilia aqueles que se ajudam a si mesmos. Uma pessoa com fome não pode encontrar comida se não sair para buscá-la, nem o desempregado arruma emprego se não aprimorar-se ou se não buscar trabalho todos os dias. Se há algo parecido com o que as pessoas comuns chamam de sorte, ela só ocorre quando vamos em sua busca. Quem fica parado, esperando algo cair do Céu, provavelmente lamentará sua falta de sorte. A questão é que nem a imagem de Deus atravessa sozinha um rio, e precisa de ajuda. Do mesmo modo, o ser humano, ao empreender qualquer coisa, tem que primeiro planejar por si mesmo, e ter em vista seus próprios recursos e possibilidades. Se seus planos forem bons, ele conseguirá despertar o auxílio dos outros; se forem sábios, ele obterá as bençãos do Céu. Em situações difíceis, portanto, é melhor contar consigo mesmo, e tomar cuidado em depositar confiança exagerada naquilo que não dispomos em nós mesmos.
52. Não se vira monge tarde na vida
Em qualquer época da vida pode se buscar a sabedoria,mas quanto mais cedo, melhor. Quem adquire certo hábito ao longo da vida dificilmente o muda na velhice, assim como é difícil trabalhar em outra profissão após passar anos labutando na mesma. Modificações drásticas na vida são complexas e dificultosas, e por isso, devemos começar a pensar no caminho da sabedoria tão logo pudermos. Se percebemos, contudo, que a mudança é necessária, um esforço tremendo não deve ser causa de vergonha. Em geral, os que tentam nos demover dos nossos planos de sabedoria são amigos do fracasso, e deve-se ter cautela em ouví-los.
53. Fracassar não é cair, é não se levantar
Qualquer um que deseje transformar sua própria vida enfrenta desafios diversos, principalmente por parte dos que professam a ignorância. Fazer planos é um exercício exaustivo e dificultoso, cujas promessas de sucesso podem falhar. No entanto, não se deve desistir, se já se começou. Disse Mêncio: quando o Céu nos prepara para uma grande missão, ele estropia nossos sentimentos, retira nossas posses e nos põe de joelhos. Isso ocorre porque apenas quem perde entende o valor das coisas; só quem sofre dá valor a felicidade; e somente quem está de joelhos pode se levantar. Assim sendo, tropeçar é parte do andar; mas ficar parado é a apologia da covardia.
54. Quando há confiança, nenhuma prova é necessária; quando não há, nenhuma é possível
Confiar cegamente não é o ideal; desconfiar totalmente, e sempre, é o atrevimento do tolo. Deve-se desconfiar com fundamentos, bem como só se deve crer com fundamentos. Devemos sempre ponderar sobre o aquilo que duvidamos; e buscar mestres quando não temos os conhecimentos necessários para decidir. Por isso, deve-se confiar nos mestres, cuja amplitude dos saberes ultrapassa nossa compreensão imediata. A confiança que neles depositamos se funda, portanto, em saber que eles trilham o caminho. Mas isso não adianta nada para os incrédulos; em sua pretensão de sabedoria, eles não acreditam em nada, tripudiam de tudo, e maltratam os saberes apropriados. Com eles, não se desperdiçam palavras - enquanto alguém não se dispoe a ouvir, do que adianta falar? não de pode ensinar para quem não quer aprender.
56. O sábio fala com os olhos; o tolo incomoda os ouvidos
Quando alguém sorri, as intenções por trás deste ato podem ser inúmeras. Um sorriso pode significar felicidade, falsa alegria, constrangimento, mordacidade... Por isso, uma expressao facial diz muito, e fica ainda mais complicada para ser decifrada se não entendermos o contexto. Um sábio, porém, deixa transparecer seus sentimentos em sua face, exceto quando é necessário comedir-se ou controlar-se. Ele busca que seus atos correspondam exatamente as suas palavras; e que sem palavras, ela possa dizer o que é necessário. Já o tolo nunca consegue se explicar devidamente, e amontoa as pessoas de palavras, tentando convencê-las de suas parvonices por meio do cansaço e da inconveniência. É um transtorno aturá-lo.
57. O desgosto se esconde no vinho; o amor, na poesia
Se o vinho existe, é por alguma razão - pois nada existe sem uma razão. O vinho existe para aliviar as tristezas, aquecer o coração, afastar as preocupações e aproximar os amigos. Deve-se desconfiar de quem bebe demais, pois estes incomodam demasiado e trazem consigo problemas que se recusam a enfrentar. Devemos desconfiar ainda mais de quem não bebe, pois exceto os que tem votos religiosos, pessoas que não bebem buscam ocultar seu lado mais malévolo - e tanto receio assim de relaxar deve ser entendido como algo temerário, e como desejos da pior espécie. Assim, o vinho serve para fortalecer vontades, esquecer problemas, ou mesmo para abrir a mente a novos ângulos de pensamento. Do mesmo modo, aqueles que amam a humanidade promovem coisas boas por meio da poesia e da música. Estes são os meios universais de divulgar boas idéias entre as pessoas, e atingem a todos, graças a sua beleza e sensibilidade. Não se estranhe, pois, que bons bêbados as vezes arrisquem poesias - com Libai e Dufu deu certo...
58. O prumo é medida do certo e do errado
Quando se encontra alguém de quem todos falam mal, desconfie; todas as pessoas tem alguma virtude, e até mesmo entre ladrões há lealdade. Se encontramos alguém de quem todo alam bem, fuja: este é o demônio, que engana os incautos e agrada seus seguidores. Alguém de quem metade fala bem, e outra metade fala mal, este é o sábio, e se pode seguí-lo; porque metade fala bem pois reconhece suas virtudes; e a outra metade fala mal dele pelo mesmo motivo.
59. O sábio assiste ao xadrez quieto; o tolo dá sua opinião sem pedirem
O jogo de xadrez é um profundo exercício de inteligência; por isso o sábio o respeita, enquanto o tolo dá opiniões de momento, sem conhecer a fundo o desenrolar das coisas. Assim também, ao longo da vida, o sábio contempla muitas coisas antes de dar seu parecer, e só o faz se necessário ou a pedido. O parvo, porém, sempre tem grandes idéias sobre o que não entende, e quem o segue, merece perder o jogo.
60. Quem não tem nada a perder, põe medo em mil
O poder do louco é o mesmo do sábio, mas com uma ressalva: o sábio tem a razão consigo, o louco não. Ambos, porém, são absolutamente sinceros no que acreditam. A diferença é o que o sábio pondera sobre o que fará, e o louco não. No entanto, o louco mostra de maneira clara o poder da obstinação: ele diz o que pensa, sem receios. Quando violento, amedronta mil pessoas; ao declarar a verdade, incomoda os mais intocáveis. O louco e o sábio provam absolutamente o poder da verdade que trazem consigo - mas o sábio pensa no futuro, e por isso é venerado - mas não será ele, também, um tanto louco?
61. Morre o leopardo, mas sua pele fica
Quem realiza coisas grandes permanece após sua morte, e continua sendo admirado. Mais do que beleza, também inspira coragem; mais do que força, inspira conhecimento; e mais do que sorte, inspira a obstinação.
62. Quadrado no exterior, circular no interior
O cacto é espinhoso por fora, mas é doce e aquoso por dentro. Do mesmo modo, o sábio muitas vezes aparenta severidade e dureza em seu exterior, mas possui uma grande generosidade e amor pela humanidade por dentro. Se não se procura o sábio, porém, como se pode saber que ele é o sábio? Quem apenas se guia por aparências, lamenta que suas roupas não condizem com seu íntimo - mas isso não interessa ao sábio, senão como objeto de estudo.
63. Em tempos de paz é que se fazem planos
Como todas as coisas são yin e yang, o previdente sabe que os bons tempos vão mudar em algum momento. O que está equilibrado agora, irá se alterar no futuro - é o ciclo da mutação. Por isso, o sábio observa as coisas como estão e faz planos para o futuro, tentando imaginar como preservar o equilíbrio. A maior parte das pessoas, porém, não se preocupa em imaginar alternativas ao que está funcionando agora, e assim promovem o descaso em relação aos problemas vindouros. Quando as calamidades se apresentam, os tolos se põe a pensar no que fazer, e as soluções nunca são ideiais, pois se baseiam no imediatismo e na carência de opções. A adversidade pode ser um bom mestre, mas o sábio lida com ela antes que ela surja. Por estas razões, o sábio sempre busca imaginar o futuro, e quando é chamado a aconselhar, chega-se a acreditar que ele é um vidente, apenas porque imaginou antes o que está agora.
64. Mestre é aquele que têm alunos
O sábio tem discípulos que percebem sua sabedoria, e por isso é um mestre; mas há professores que somente enganam os incautos, espalhando uma suposta sabedoria que se alcança com facilidade, pouco esforço e muita arrogância. Ora, nada na vida se conquista sem aprendizado ou estudo; portanto, o aluno que acredita em falsos mestres é, também, um falso discípulo - em verdade, talvez nem mesmo estes alunos acreditem em seu mestre, mas desejam o título que ele pode lhes dar. Assim, os falsários tem seus discípulos ignorantes e picaretas. Mestre, pois, é quem tem alunos - mas existem somente os bons mestres; os maus, não o são.
64
Assim como no Tratado das Mutações, são 64 os fragmentos para compreender o mundo da mutação.
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