As muralhas não foram feitas para proteger-se dos inimigos – elas forma construídas para manter um povo na ignorância. As muralhas não podem deter inimigos determinados, mas se presta mais facilmente a cercear o direito de uma sociedade perambular livremente. Os portões controlam as entradas, mas também as saídas. Povos amenos e simpáticos tem amigos, e não precisam de muralhas; pessoas desprendidas não acumulam riquezas, e assim não atraem bandidos. Grandes muros são construídos por déspotas, que tornam o restante do mundo uma grande incógnita. Com isso, um povo não conhece opções, nem sabe o que há lá fora. Sem alternativas, eles se voltam para si mesmos, lutam por pequenas coisas e são fáceis de dominar.
Alguns dizem: “mas estes de fora são desconhecidos”. Para um sábio, desconhecido é apenas um amigo que não foi feito; os imbecis desconfiam de tudo, e quando se abrem, o fazem de modo negligente, se expondo ao perigo.
Por isso, Confúcio defendia a educação e a sociabilidade. Este caminho constrói pontes entre as pessoas; mas justamente por esta razão, os governantes não ouviam Confúcio. Qin construiu a primeira grande muralha da China, e caiu; Ming a reformou, expandiu, e também cedeu aos invasores. Construir muralhas é fazer barreiras entre as culturas e as pessoas – e isso não pode ser bom. Melhor é conhecer, sempre, de modo a compreender o outro em sua própria cultura.
Disse Mêncio que o sábio nunca perde seu coração de criança. Crianças adoram trepar em muros para descobrir o que há do outro lado. Assim, também, o sábio atravessa as muralhas para buscar o que não conhece, e aprender sobre o que não sabe. Só deste modo pode-se obter uma verdadeira paz, pelo entendimento mútuo entre sociedades diferentes. Só pela demolição das muralhas as pessoas poderão ser sábias, saindo de seus mundos pequenos e trancafiados, e sendo expostas à diversidade da manifestação das coisas.
Os povos das estepes viviam livres, mas em conflito. Quando conheceram outros mundos, aprenderam a se unir; quando se uniram, dominaram o mundo; quando dominaram, aprenderam coisas novas e se modificaram para melhor; mas quando começaram a viver dentro de muralhas, caíram na indolência, perderam sua força e foram derrotados e expulsos da China e do restante do mundo.
Que lástima, quando as sociedades têm tradições em muralhas! Significa uma luta constante contra a sabedoria e a paz. Que muralha afastou, de fato, os invasores estrangeiros da China? Que muralha salvou os romanos na Inglaterra? Muros enfraquecem a mente, a não ser que sejam burlados. Barreiras separam povos e culturas, evitando seu entendimento. Em certas ocasiões da história, elas parecem ter ser sido necessárias para a defesa, e acabaram tão logo cumpriram seu papel.
A boca fechada é como uma muralha: ela impede o sorriso. Quantos conflitos poderiam ser assim evitados! Conheçamos os outros – o que é mais sábio – e não façamos muralhas, para não criarmos novos crimes. A passagem da vida nos foi aberta e dada sem que nos perguntássemos por quê. Porventura, aceitamos de bom grado quando alguém nos impõe limites, por meio de uma muralha, em nossa existência?
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